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domingo, 9 de abril de 2023

Catequese do Papa Bento XVI: Páscoa (2011)

Uma vez que na Semana Santa publicamos a Catequese do Papa Bento XVI sobre o Tríduo Pascal em 2011, propomos aqui a reflexão sobre a Páscoa proferida pelo Papa alemão no mesmo ano:

Papa Bento XVI
Audiência Geral
Quarta-feira, 27 de abril de 2011
A Páscoa

Queridos irmãos e irmãs,
Nestes dias do Tempo Pascal, que se prolonga até o Pentecostes, ainda estamos cheios do vigor e da alegria nova que as celebrações litúrgicas trouxeram aos nossos corações. Portanto, hoje gostaria de meditar convosco brevemente sobre a Páscoa, coração do mistério cristão. Com efeito, tudo começa aqui: Cristo Ressuscitado dos mortos é o fundamento da nossa fé. Da Páscoa irradia-se, como que de um centro luminoso, incandescente, toda a Liturgia da Igreja, haurindo dela conteúdo e significado. A celebração litúrgica da Morte e Ressurreição de Cristo não é uma simples comemoração deste acontecimento, mas sim a sua atualização no mistério, para a vida de cada cristão e de cada comunidade eclesial: para a nossa vida. Com efeito, a fé em Cristo Ressuscitado transforma a existência, realizando em nós uma ressurreição contínua, como escrevia São Paulo aos primeiros fiéis: «Outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor: portanto, comportai-vos como verdadeiras luzes. Ora, o fruto da luz é bondade, justiça e verdade» (Ef 5,8-9).

Papa Bento XVI
Bênção Urbi et Orbi de Páscoa (2011)

Então, como podemos fazer com que a Páscoa se torne «vida»? Como pode toda a nossa existência interior e exterior assumir uma «forma» pascal? Temos que começar a partir da compreensão autêntica da Ressurreição de Jesus: este acontecimento não é uma simples volta à vida precedente, como o foi para Lázaro, para a filha de Jairo ou para o jovem de Naim, mas é algo completamente novo e diferente. A Ressurreição de Cristo é a chegada a uma vida já não submetida à caducidade do tempo, uma vida imersa na eternidade de Deus. Na Ressurreição de Jesus tem início uma nova condição do ser humano, que ilumina e transforma o nosso caminho de todos os dias e abre um futuro qualitativamente diverso e novo para toda a humanidade. Por isso, São Paulo não só une de maneira inseparável a ressurreição dos cristãos à de Jesus (1Cor 15,16.20), mas indica também como devemos viver o Mistério Pascal na quotidianidade da nossa vida.

Na Carta aos Colossenses, ele diz: «Se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres » (Cl 3,1-2). À primeira vista, lendo este texto, poderia parecer que o Apóstolo tenciona favorecer o desprezo das realidades terrenas, ou seja, convidando a esquecer-se deste mundo de sofrimentos, de injustiças e de pecados, para viver antecipadamente em um paraíso celeste. Em tal caso, o pensamento do «céu» seria uma espécie de alienação. Contudo, para compreender o verdadeiro sentido destas afirmações paulinas, é preciso não as separar do contexto. O Apóstolo especifica muito bem aquilo que quer dizer com «as coisas do alto», que o cristão deve buscar, e «as coisas terrestres», das quais se deve precaver. Eis, em primeiro lugar, quais são «as coisas terrestres» que é necessário evitar: «Fazei morrer - escreve São Paulo - o que em vós pertence à terra: imoralidade, impureza, paixão, maus desejos e a cobiça, que é idolatria» (Cl 3,5). Mortificar em nós o desejo insaciável de bens materiais, o egoísmo, raiz de todo o pecado. Por conseguinte, quando o Apóstolo convida os cristãos a desapegar-se com determinação das «coisas terrestres», quer claramente fazer compreender aquilo que pertence ao «homem velho», do qual o cristão deve despojar-se para se revestir de Cristo.

Como foi claro ao dizer quais são as coisas em que não devemos fixar o nosso coração, com igual clareza São Paulo indica quais são as «coisas do alto», que o cristão deve procurar e saborear. Elas dizem respeito àquilo que pertence ao «homem novo», que se revestiu de Cristo de uma vez por todas no Batismo, mas tem sempre necessidade de se renovar «segundo a imagem do seu Criador» (Cl 3,10). Eis como o Apóstolo das Nações descreve estas «coisas do alto»: «Vós sois amados por Deus, sois os seus santos eleitos. Por isso, revesti-vos de sincera misericórdia, bondade, humildade, mansidão e paciência, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente (...). Mas, sobretudo, amai-vos uns aos outros, pois o amor é o vínculo da perfeição» (Cl 3,12-14). Portanto, São Paulo está muito longe de convidar os cristãos, cada um de nós, a evadir-se do mundo onde Deus nos inseriu. É verdade que nós somos cidadãos de outra «cidade», onde se encontra a nossa verdadeira pátria, mas temos que percorrer quotidianamente nesta terra o caminho rumo àquela meta. Participando desde agora na vida de Cristo Ressuscitado, temos que viver como homens novos neste mundo, no coração da cidade terrena.

E este é o caminho não só para transformar a nós mesmos, mas para transformar o mundo, para conferir à cidade terrena um rosto novo que favoreça o desenvolvimento do homem e da sociedade, segundo a lógica da solidariedade, da bondade, no profundo respeito pela dignidade própria de cada um. O Apóstolo recorda-nos quais são as virtudes que devem acompanhar a vida cristã: no ápice está a caridade, com a qual todas as demais estão relacionadas, como com a fonte e a matriz. Ela resume e compendia «as coisas do céu»: a caridade que, com a fé e a esperança, representa a grande regra de vida do cristão e define a sua profunda natureza.

Portanto, a Páscoa traz a novidade de uma passagem profunda e total, de uma vida sujeita à escravidão do pecado para uma vida de liberdade, animada pelo amor, força que abate todas as barreiras e edifica uma nova harmonia no próprio coração e na relação com os outros e com as coisas. Cada cristão, assim como cada comunidade, se viver a experiência desta passagem de ressurreição, não pode deixar de ser fermento novo no mundo, entregando-se incondicionalmente às causas mais urgentes e mais justas, como demonstram os testemunhos dos Santos de cada época e de cada lugar. São numerosas também as expectativas do nosso tempo: nós, cristãos, acreditando firmemente que a Ressurreição de Cristo renovou o homem sem tirá-lo do mundo em que constrói a sua história, devemos ser as testemunhas luminosas desta nova vida que a Páscoa trouxe. Portanto, a Páscoa é dom a acolher cada vez mais profundamente na fé, para poder agir em todas as situações, com a graça de Cristo, segundo a lógica de Deus, a lógica do amor. A luz da Ressurreição de Cristo deve penetrar neste nosso mundo, deve chegar como mensagem de verdade e de vida a todos os homens, através do nosso testemunho diário.

Caros amigos, sim, Cristo verdadeiramente ressuscitou! Não podemos conservar apenas para nós a vida e a alegria que Ele nos concedeu na sua Páscoa, mas devemos doá-la àqueles dos quais nos aproximamos. É a nossa tarefa e a nossa missão: fazer ressurgir no coração do próximo a esperança onde há desespero, a alegria onde há tristeza, a vida onde há morte. Testemunhar todos os dias a alegria do Senhor Ressuscitado significa viver sempre de «modo pascal» e fazer ressoar o feliz anúncio de que Cristo não é uma ideia ou uma recordação do passado, mas uma Pessoa que vive conosco, por nós e em nós, e com Ele, por Ele e n’Ele nós podemos renovar todas as coisas (Ap 21,5).


Fonte: Santa Sé.

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