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quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Jubileu dos Bispos no ano 2000

No dia 08 de outubro do ano 2000 o Papa João Paulo II celebrou a Santa Missa na Praça de São Pedro por ocasião do Jubileu dos Bispos no contexto do Ano Santo.

Curiosamente a homilia do Santo Padre faz referência aos textos do XXVIII Domingo do Tempo Comum (ano B), quando na ocasião se celebrava o XXVII Domingo.

Jubileu dos Bispos
Homilia do Papa João Paulo II
08 de outubro de 2000

1. Dá-nos, ó Deus, a sabedoria do coração(Salmo responsorial).
Hoje a Praça de São Pedro assemelha-se a um grande Cenáculo: de fato, nela encontram-se Bispos de todas as partes do mundo, vindos a Roma para celebrar o seu Jubileu. A memória do Apóstolo Pedro, evocada pelo seu túmulo sob o altar da grande Basílica do Vaticano, convida-nos a regressar espiritualmente à primeira sede do Colégio Apostólico, àquele Cenáculo de Jerusalém, onde recentemente tive a alegria de celebrar a Eucaristia, durante a minha peregrinação na Terra Santa.
Uma ponte ideal, que ultrapassa séculos e continentes, une hoje o Cenáculo a esta Praça, na qual marcaram encontro aqueles que, no Ano Santo de 2000, são os sucessores dos primeiros Apóstolos de Cristo. Caríssimos e venerados irmãos, chegue a todos vós o meu abraço cordial que faço extensivo com afeto a quantos não puderam vir mas, das suas sedes, estão espiritualmente unidos a nós.


Juntos façamos nossa a invocação do Salmo: “Dá-nos, ó Deus, a sabedoria do coração”. Nesta sapientia cordis, que é dom de Deus, podemos resumir o fruto da nossa convocação jubilar. Ela consiste na conformação interior a Cristo, Sabedoria do Pai, mediante a ação do Espírito Santo. Para obtermos este dom, indispensável para o bom governo da Igreja, nós Pastores devemos ser os primeiros a entrar por Ele, “porta das ovelhas” (Jo 10,7). Devemos imitá-lo, o “Bom Pastor” (Jo 10,11.14), porque se ouvimos os fiéis é a Ele que ouvimos, e ao seguirem-nos seguem a Ele, que é o único Salvador ontem, hoje e sempre.

2. Deus dá a sabedoria do coração através da sua Palavra, viva, eficaz, capaz de descobrir o coração do homem como nos disse o autor da Carta aos Hebreus (cf. Hb 4,12), no trecho que acabamos de proclamar. A Palavra divina, depois de ter sido dirigida “nos tempos antigos, muitas vezes e de muitos modos... aos antepassados por meio dos profetas” (Hb 1,1), nos últimos tempos foi enviada aos homens na pessoa do Filho (cf. Hb 1,2).
Nós pastores, em virtude do munus docendi, fomos chamados a ser anunciadores qualificados desta Palavra. “Quem vos ouve, a Mim ouve” (Lc 10,16). Tarefa exaltante, mas também grande responsabilidade! Foi-nos confiada uma palavra viva: por conseguinte, devemos anunciá-la em primeiro lugar com o exemplo e depois com as palavras. É palavra que coincide com a pessoa do próprio Cristo, o “Verbo que se fez homem” (Jo 1,14): é, por conseguinte, o rosto de Cristo que devemos mostrar aos homens; a sua cruz que devemos anunciar, fazendo-o com o vigor de Paulo: “Entre vós, eu não quis saber outra coisa a não ser Jesus Cristo, e Jesus Cristo Crucificado” (1Cor 2, 2).

3. Eis que nós deixamos tudo e Te seguimos (Mc 10,28). Esta afirmação de Pedro exprime a radicalidade da opção que é pedida ao Apóstolo. Uma radicalidade que se esclarece à luz do diálogo exigente, entre Jesus e o jovem rico. Como condição para alcançar a vida eterna, o Mestre indicara-lhe o cumprimento dos mandamentos. Perante o seu desejo de maior perfeição, respondera com um olhar de amor e uma proposta total: “Vai, vende tudo, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro nos céus. Depois vem e segue-Me” (Mc 10,21). Estas palavras de Cristo provocaram, como um obscurecer-se repentino do céu, a tristeza da recusa. Foi então que Jesus pronunciou uma das suas sentenças mais severas: “Meus filhos, como é difícil entrar no Reino de Deus!” (Mc 10,24). Sentença que Ele próprio atenuou, perante o medo dos Apóstolos, apelando ao poder de Deus: “A Deus tudo é possível” (Mc 10,27).
A intervenção de Pedro torna-se expressão da graça com que Deus transforma o homem e o torna capaz de se doar totalmente: “Eis que nós deixamos tudo e Te seguimos” (Mc 10,28). É desta forma que nos tornamos Apóstolos. É igualmente desta maneira que se vive a realização da promessa de Cristo a respeito do “cêntuplo”: o Apóstolo que deixa tudo para seguir Cristo já vive nesta terra, apesar das provações inevitáveis, uma existência realizada e jubilosa.
Estimados irmãos, como deixar de exprimir, neste momento, o nosso reconhecimento ao Senhor pelo dom da vocação, primeiro ao sacerdócio e depois à sua plenitude no episcopado? Olhando para as vicissitudes passadas da nossa vida, a comoção invade o nosso coração ao verificarmos de quantas formas o Senhor nos demonstrou o seu amor e a sua misericórdia. Deveras, misericordias Domini in aeternum cantabo! (Sl 88,2).

4. O Bispo, sucessor dos Apóstolos, é uma pessoa para quem Cristo é tudo. Ele pode repetir com Paulo todos os dias: “Para mim, viver é Cristo...” (Fl 1,21). Eis o que deve testemunhar com todo o seu comportamento. O Concílio Vaticano II ensina: “Os Bispos devem dedicar-se à sua missão apostólica como testemunhas de Cristo diante de todos os homens” (Christus Dominus, n. 11).
Ao falar dos Bispos como testemunhas, não posso deixar de recordar, nesta solene celebração jubilar, os numerosos Bispos que, ao longo de dois milênios, deram a Cristo o supremo testemunho do martírio, conformando-se com o modelo apostólico e fecundando a Igreja com a efusão do seu sangue.
O século XX foi, de modo particular, rico destas testemunhas, algumas das quais eu próprio tive a alegria de elevar às honras dos altares. Há uma semana inscrevi no álbum dos Santos quatro Bispos mártires na China: Gregório Grassi, Antonino Fantosati, Francisco Fogolla e Luís Versiglia. Entre os Beatos, veneramos Michael Kozal, Antoni Julian Nowowiejski, Leon Wetmanski e Władisław Goral, mortos nos campos de concentração nazistas. A eles unem-se Diego Ventaja Milán, Manuel Medina Olmos, Anselmo Polanco e Florentino Asencio Barroso, mortos durante a Guerra Civil espanhola. Depois, no prolongado inverno do totalitarismo comunista floresceram, na Europa Oriental, os Beatos mártires Guilherme Apor, húngaro; Vicenzo Eugênio Bossilkov, búlgaro; e Alojzije Stepinac, croata.
Ao mesmo tempo, é bonito e imperioso que agradeçamos a Deus todos os Pastores sábios e generosos que, ao longo dos séculos, enriqueceram a Igreja com os seus ensinamentos e exemplos. Quantos Santos e Beatos confessores há entre os Bispos! Penso, por exemplo, nas luminosas figuras de Carlos Borromeu e de Francisco de Sales; penso também nos Papas Pio IX e João XXIII, que recentemente tive a alegria de proclamar Beatos.
Caríssimos irmãos no Episcopado, “rodeados dessa grande nuvem de testemunhas” (Hb 12,1), renovemos a nossa resposta ao dom de Deus, recebido com a Ordenação Episcopal. “Deixemos de lado tudo o que nos embaraça e o pecado que se agarra a nós. Corramos com perseverança a corrida, mantendo os olhos fixos em Jesus” (Hb 12,1-2), Pastor dos pastores.

5. Considerando o mistério da Igreja e a sua missão no mundo contemporâneo, o Concílio Ecumênico Vaticano II sentiu a necessidade de dedicar uma atenção especial ao múnus pastoral dos Bispos. Hoje, no limiar do terceiro milênio, o desafio da nova evangelização ressalta ulteriormente o ministério episcopal: o Pastor é o primeiro responsável e animador da comunidade eclesial, quer na exigência de comunhão quer na projeção missionária. Perante o relativismo e o subjetivismo que debilitam muitos setores da cultura contemporânea, os Bispos são chamados a defender e promover a unidade doutrinal dos seus fiéis. Solícitos em todas as situações nas quais a fé não existe ou é ignorada, eles empenhem-se com todas as forças em favor da evangelização, preparando para esta finalidade sacerdotes, religiosos e leigos e pondo à disposição os recursos necessários (cf. Christus Dominus, 6).
Tendo presente o ensinamento conciliar (cf. ibid., n. 7), queremos hoje exprimir nesta Praça a nossa fraterna solidariedade aos Bispos que são objeto de perseguição, que estão na prisão ou são impedidos de exercer o seu ministério. E em nome do vínculo sacramental, as nossas afetuosas recordação e oração dirigem-se aos irmãos sacerdotes que sofrem as mesmas provações. A Igreja está-lhes grata pelo bem inestimável que oferecem ao Corpo místico de Cristo com a sua oração e sacrifício.

6. A bondade do Senhor venha sobre nós e confirme a obra das nossas mãos (Sl 89,17).
Estimados irmãos no Episcopado, neste nosso Jubileu a bondade do Senhor desceu em abundância sobre nós. A luz e a força que promanam dela não deixarão de fortalecer a “obra das nossas mãos”, isto é, o trabalho que nos foi confiado no campo de Deus que é a Igreja.
Nestas jornadas jubilares, quisemos ressaltar a presença entre nós de Maria Santíssima, nossa Mãe, que nos ampara e conforta. Fizemo-lo ontem à noite, com a recitação comunitária do rosário, fazemo-lo hoje, com o Ato de Consagração, que realizaremos no final da Missa. É um ato que viveremos com espírito colegial, sentindo próximos de nós os numerosos Bispos que, das respectivas sedes se unem à nossa celebração, realizando este mesmo Ato juntamente com os seus fiéis. A venerada imagem de Nossa Senhora de Fátima, que com alegria temos entre nós, ajuda-nos a reviver a experiência do primeiro Colégio Apostólico, reunido em oração no Cenáculo com Maria, Mãe de Jesus.
Rainha dos Apóstolos, reza conosco e por nós, para que o Espírito Santo desça com abundância sobre a Igreja, e ela resplandeça no mundo cada vez mais una, santa, católica e apostólica. Amém.


Fonte: Santa Sé.

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