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quarta-feira, 19 de agosto de 2020

A batina ou hábito talar

Para acessar a postagem introdutória desta série, na qual explicamos os conceitos de vestes corais e vestes talares, clique aqui.

A veste conhecida como batina ou sotaina é referida no Cerimonial dos Bispos como “hábito talar” (do latim talus, calcanhar).

O hábito talar é, pois, uma veste ampla, que desce até os calcanhares, utilizada por todos os clérigos. Sua origem remonta aos monges eremitas que, para expressar sua consagração, costumavam trajar uma túnica longa na cor preta, símbolo de sua “morte para o mundo”.

Com o tempo seu uso foi estendido a todos os sacerdotes. Além disso, foi enriquecida por alguns elementos, como os 33 botões no corpo (em alusão aos anos da vida terrena de Cristo) e cinco em cada manga (recordando o número das chagas do Senhor). Em algumas versões são 23 botões no corpo, que somados com os cinco de cada manga perfazem 33.


Em sua origem o hábito talar era inteiramente negro (como é até hoje nas Igrejas Orientais). Posteriormente, sob a influência da tradição protestante, foi acrescentada uma gola ou colarinho na cor branca, que passou a ser usado também em camisas. Este colarinho clerical é chamado de clergyman, aportuguesado para “clérgima”.

A talar costuma ser guarnecida de uma faixa, pendente sobre a perna esquerda e ornada com franjas. De um elemento prático, para ajustar a veste ao corpo, foi-lhe dado um sentido simbólico análogo ao cíngulo: prontidão para o serviço e domínio sobre o “fogo das paixões”, duplo simbolismo associado ao gesto de “cingir os rins”.


Além da faixa, a talar pode ser possuir também uma pequena capa, aberta na frente, chamada no Cerimonial de “romeira”, também conhecida como “peregrineta”. Os dois nomes remontam a uma capa usada por peregrinos ou romeiros.

Papa João Paulo II com a "romeira" do Caminho de Santiago

A seguir detalhamos as cores da veste talar usada por cada membro da hierarquia:

Presbíteros:
Os presbíteros (assim como os diáconos e seminaristas) usam sempre o hábito talar inteiramente negro, com faixa negra. Tradicionalmente o uso da romeira negra é restrita aos presbíteros: os diáconos e seminaristas comumente não a usam.

Cumpre recordar que o uso da talar por seminaristas depende da autorização do Bispo diocesano. O mesmo vale para ministros leigos que atuam como cerimoniários ou acólitos: estes usam a talar negra com sobrepeliz apenas quando permitido e somente enquanto exercem o seu ministério nas celebrações.

Quanto aos diáconos permanentes, devem estar atentos às orientações do Bispo diocesano, que pode limitar o uso da veste talar e da camisa clerical para os diáconos casados, a fim de evitar confusão entre os fiéis.

Monsenhor Guido Marini com a talar negra de presbítero

Cônegos                                               
As vestes dos cônegos variam conforme a Diocese, sendo indicadas no Estatuto de cada Cabido. Porém, uma vez que os cônegos estão diretamente ligados ao Bispo, se possuírem o direito a vestes específicas, eles só a usam dentro de sua Diocese [1].

Fora de sua Diocese e no uso quotidiano os cônegos vestem a talar negra, como os presbíteros, geralmente sem a faixa e sem a romeira.

Monsenhores Capelães de Sua Santidade
Tanto como veste coral quanto em ocasiões solenes fora da Liturgia usam a talar negra com detalhes (como orla, costuras e botões) na cor violeta (também dita violácea) e faixa violeta. Não usam a romeira.
No quotidiano usam a talar negra, como os presbíteros, sem faixa e sem romeira.

Monsenhores Prelados de Honra ou Protonotários Apostólicos supranumerários
Possuem o direito a dois tipos de hábito talar:
- talar violeta com faixa da mesma cor, usada como veste coral;
- talar negra com detalhes em vermelho, faixa violeta e sem romeira, para ocasiões solenes fora da Liturgia.
No quotidiano usam a talar negra, como os presbíteros, sem a faixa e sem a romeira.

Protonotários Apostólicos numerários
As mesmas vestes dos Monsenhores Prelados de honra, como acima.

Monsenhores Guido Marini e Ján Dubina assistem ao Papa com a talar de Prelados de Honra

Bispos
Os Bispos também possuem direito a duas vestes:
- talar inteiramente violeta, com detalhes e mangas em vermelho, com faixa violeta, como veste coral;
- talar negra com detalhes em vermelho, faixa violeta e romeira também com detalhes em vermelho, para ocasiões solenes fora da Liturgia.

Sempre que usam a talar os Bispos usam também a cruz peitoral, pendente de cordão verde e ouro com as vestes corais ou pendente de corrente simples com as demais vestes.

No quotidiano os Bispos usam a talar negra, como os presbíteros, sem a faixa e sem a romeira, com a cruz peitoral pendente de corrente simples. Os Bispos religiosos, por sua vez, podem usar o hábito da sua Ordem ou congregação. O uso do solidéu nestes casos é facultativo.

Cardeal Ratzinger com a talar negra e cruz peitoral

Cardeal Sean O'Malley com o hábito franciscano e cruz peitoral

Cardeais
Os Cardeais usam as mesmas vestes que os Bispos, exceto que a faixa é também na cor vermelha e o cordão para a cruz peitoral usada com as vestes corais é vermelho e ouro.

Papa
Por fim, embora o Cerimonial dos Bispos não o mencione, o Papa usa sempre uma talar branca, com a faixa branca (geralmente com o seu brasão bordado) e romeira.

A cruz peitoral do Papa costuma ser usada com um cordão dourado quando acompanha as vestes corais ou com uma corrente simples, como os Bispos, nos demais casos.

Cumpre notar que o Bispo Emérito de Roma, Bento XVI, conservou o uso da batina branca, porém sem a faixa e sem a romeira, para distingui-lo do Papa reinante.

Papa Francisco (com a romeira) e Bento XVI (sem a romeira)

Hábito talar em países tropicais
Por fim, cabe ressaltar a concessão feita por tradição a países tropicais, por conta do calor: todos os clérigos podem usar uma talar branca ou creme, porém com os botões, detalhes e a faixa nas respectivas cores, conforme a hierarquia.

Por exemplo, um presbítero em um país tropical (como o Brasil) poderia usar uma talar branca com detalhes e faixa na cor preta.

Monsenhores Guido Marini e Vincenzo Peroni assistem ao Papa com a talar tropical no Panamá

[1] cf. COELHO, Dom António. Curso de Liturgia Romana. Tomo II: Liturgia sacrifical. Editora Pax: Braga, 1943, p. 242.

Fonte:
CERIMONIAL DOS BISPOS, Cerimonial da Igreja. Tradução portuguesa da edição típica. Apêndice I: Vestes prelatícias. São Paulo: Paulus, 1988, pp. 311-313.

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