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quinta-feira, 30 de agosto de 2018

O discurso do Papa à Semana Litúrgica Italiana

Nas últimas semanas, o site Vatican News publicou uma série de quatro textos comentando e aprofundando o discurso proferido pelo Papa Francisco aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional, no dia 24 de agosto de 2017, que nós publicamos aqui há exatamente um ano.
Estas postagens foram intercaladas pelos textos sobre a História do Movimento Litúrgico, que igualmente já publicamos aqui.

30 de maio de 2018

Na edição de hoje deste nosso espaço memória histórica, vamos recordar alguns pontos destacados pelo Papa Francisco em 24 de agosto de 2017, ao dirigir-se aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional, por ocasião dos 50 anos da Constituição Sacrosanctum Concilium.
Por ocasião do aniversário de 50 anos da Constituição Sacrosanctum Concilium, o Papa Francisco disse ao grupo de Liturgia da Conferência Episcopal da Itália que a reforma na Liturgia, proposta pelo Concilio, não pode retroceder, tem que avançar, e que há muito que realizar no Povo de Deus.
Na Sala Paulo VI, o Papa fez um discurso aos participantes na 68ª Semana Litúrgica Nacional na Itália, em 24 de agosto de 2017, recordando as etapas de todo o movimento litúrgico, que culminaram na compilação da Constituição Sacrosanctum Concilium.
Papa Francisco resgata na história da Igreja as origens da reforma litúrgica. Na verdade o movimento litúrgico, anterior ao concilio, começou 200 anos antes. Papa Francisco disse assim em agosto desse ano: “Penso em São Pio X que dispôs uma reorganização da música sacra e a restauração celebrativa do domingo, e instituiu uma comissão para a reforma geral da liturgia, ciente de que isto teria comportado «um trabalho quer grande quer diuturno; e por isso - como ele mesmo reconhecia - é necessário que passem muitos anos, antes que este, por assim dizer, edifício litúrgico [...] reapareça de novo esplendoroso na sua dignidade e harmonia, quando tiver sido como que limpo da desolação do envelhecimento”.
O projeto reformador - segundo palavras do próprio Papa Francisco - foi retomado por Pio XII com a Encíclica Mediator Dei (1947) e com a instituição de uma comissão de estudo; também ele tomou decisões concretas acerca da versão do Saltério, da atenuação do jejum eucarístico, do uso da língua viva no Ritual (1955), da importante reforma da Vigília Pascal e da Semana Santa. Deste impulso, a exemplo de outras nações, surgiu na Itália o Centro de Ação Litúrgica, guiado por Bispos cuidadosos do povo a eles confiado e animado por estudiosos que amavam a Igreja e a pastoral litúrgica.
Pio XII, em 1947 - quase 20 anos antes do concilio Vaticano II - dizia assim na Encíclica Mediator Dei, no número 46: “Em verdade, não poucas são as causas pelas quais se explica e desenvolve o progresso da sagrada liturgia durante a longa e gloriosa história da Igreja. Assim, por exemplo, uma formação mais certa e ampla da doutrina católica sobre a encarnação do Verbo de Deus, sobre os sacramentos, sobre o sacrifício eucarístico, e sobre a virgem Maria Mãe de Deus, contribuiu para a adoção de novos ritos, por meio dos quais a luz, mais esplendidamente brilhante na declaração do magistério eclesiástico, veio a refletir melhor e mais claramente nas ações litúrgicas para unir-se com maior facilidade à mente e ao coração do povo cristão”.
Também nessa Encíclica, Pio XII já falava da participação consciente dos fiéis na liturgia: “É necessário, pois, veneráveis irmãos, que todos os fiéis tenham por seu principal dever e suma dignidade participar do santo sacrifício eucarístico, não com assistência passiva, negligente e distraída, mas com tal empenho e fervor que os ponha em contato íntimo com o sumo sacerdote, como diz o Apóstolo: ‘Tende em vós os mesmos sentimentos que Jesus Cristo experimentou’, oferecendo com ele e por ele, santificando-se com ele (Mediator Dei, 73)”.

18 de julho de 2018

Temos dedicado diversos programas deste nosso espaço à reforma litúrgica, suas raízes e à Constituição Sacrosanctum Concilium, promulgada pelo Papa Paulo VI no dia 4 de dezembro de 1963, no final da segunda sessão conciliar, e definida pelo Papa Francisco como “bom fruto da árvore da Igreja”, ao dirigir-se em 24 de agosto de 2017 aos participantes da Semana Litúrgica Italiana. O Papa enfatizou na ocasião que “a Liturgia é vida para todo o povo”, “não uma ideia a ser compreendida” e “sem a presença real do mistério de Cristo, não há qualquer vitalidade litúrgica”.
Por ocasião do aniversário do 50 anos da Constituição Sacrosanctum Concilium, o Papa Francisco, na Sala Paulo VI, fez um discurso aos Participantes na 68ª Semana Litúrgica Nacional – na Itália, em 24 de agosto de 2017, recordando aspectos importantes da preparação do movimento litúrgico para a elaboração da Constituição Sacrosanctum Concilium.
O Concílio Vaticano II - diz o Papa Francisco - fez madurar depois, como bom fruto da árvore da Igreja, a Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium (SC), cujas linhas de reforma geral respondiam às necessidades reais e à esperança concreta de uma renovação: desejava-se uma liturgia viva para uma Igreja toda vivificada pelos mistérios celebrados. Tratava-se de expressar de maneira renovada a vitalidade perene da Igreja em oração, tendo o cuidado de que “os cristãos não entrem neste mistério de fé como estranhos ou espectadores mudos, mas participem na ação sagrada, consciente, ativa e piedosamente, por meio duma boa compreensão dos ritos e orações” (SC, 48).
O Papa lembrou o rumo traçado pelo Concílio que encontrou forma, segundo o princípio do respeito da tradição sadia e do progresso legítimo (cf. SC, 23), nos livros litúrgicos promulgados pelo Beato Paulo VI, bem recebidos pelos próprios Bispos que participaram no Concílio, e já há quase 50 anos universalmente em uso no Rito Romano. A aplicação prática, guiada pelas Conferências Episcopais nos respectivos países, ainda está a decorrer, pois não é suficiente reformar os livros litúrgicos para renovar a mentalidade. Papa Francisco lembrou de que a mentalidade também precisa ser reformada, não só os ritos ou livros.
Disse ainda que “os livros reformados nos termos dos decretos do Vaticano II desencadearam um processo que requer tempo, recepção fiel, obediência prática, atuação celebrativa sábia por parte, primeiro, dos ministros ordenados, mas também dos outros ministros, dos cantores e de todos os que participam na liturgia. Na realidade, sabemo-lo bem, a educação litúrgica dos padres, bispos e fiéis é um desafio a ser enfrentado sempre de novo. O próprio Paulo VI, um ano antes da morte, dizia aos Cardeais reunidos em Consistório: «Chegou o momento, agora, de abandonar definitivamente os fermentos desagregadores, igualmente perniciosos num sentido e noutro, e de aplicar integralmente nos seus justos critérios inspiradores, a reforma por Nós aprovada em aplicação aos votos do Concílio». E hoje ainda é preciso trabalhar neste sentido, em particular redescobrindo os motivos das decisões tomadas com a reforma litúrgica, superando leituras infundadas e superficiais, resseções parciais e práticas que a desfiguram”.
Papa Francisco diz que depois deste magistério e, após este longo caminho podemos afirmar com certeza e com autoridade magistral que a reforma litúrgica é irreversível. A reforma na Liturgia, proposta pelo Concílio, não pode retroceder, tem que avançar, e que há muito que realizar no Povo de Deus – disse Papa Francisco na mensagem aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional na Itália.

Papa: Liturgia emana do sacerdócio de Cristo
08/08/2018

Em 24 de agosto de 2017, o Papa Francisco encontrou-se com os participantes da 68ª Semana Litúrgica nacional Italiana, onde recordou alguns aspectos importantes da renovação litúrgica, destacando com veemência que a reforma do Concílio não pode retroceder. Em seu pronunciamento, entre outros, Francisco resgatou as origens da reforma litúrgica na Igreja. Vale destacar, que esta tem suas origens no movimento litúrgico, que teve início 200 anos antes do Concílio Vaticano II.
Na edição de hoje deste nosso espaço, o padre Gerson Schmidt – sacerdote incardinado na Arquidiocese de Porto Alegre – dá continuidade a esta série de reflexões, falando sobre “a Liturgia que emana do sacerdócio de Cristo”:
Papa Francisco, por ocasião do aniversário do 50 anos da Constituição Sacrosanctum Concilium, fez um discurso aos Participantes na 68ª Semana Litúrgica Nacional na Itália, em 24 de agosto de 2017, recordando aspectos importantes da renovação litúrgica. Fez memória recordando o caminho percorrido antes do Concílio. O tema dessa semana litúrgica, na Itália, foi: «Uma Liturgia viva para uma Igreja viva». Em cima do tema o Papa disse assim:
“A liturgia é «viva» em virtude da presença viva d’Aquele que «morrendo destruiu a morte e ressuscitando nos restituiu a vida» (Prefácio Pascal, 1). Sem a presença real do mistério de Cristo, não há qualquer vitalidade litúrgica. Assim como sem pulsações cardíacas não há vida humana, do mesmo modo sem o coração pulsante de Cristo não existe qualquer ação litúrgica. Com efeito, o que define a liturgia é a concretização, nos santos sinais, do sacerdócio de Jesus Cristo, ou seja, a oferta da sua vida até estender os braços na cruz, sacerdócio tornado presente de maneira constante através dos ritos e das orações, maximamente no seu Corpo e Sangue, mas também na pessoa do sacerdote, na proclamação da Palavra de Deus, na assembleia congregada em oração em seu nome (cf. SC, 7)”.  Portanto, o Papa Francisco lembra que a liturgia emana do sacerdócio de Cristo, oferecido uma vez por todas na cruz, que se perpetua agora nos sinais, nos ritos, no sacerdócio, na Palavra Proclamada, na assembleia congregada, convocada pela Palavra”.
Papa Francisco ainda recordou a visibilidade e centralidade do altar. Disse ele: “Entre os sinais visíveis do Mistério invisível está o altar, sinal de Cristo pedra viva, descartada pelos homens mas que se tornou pedra angular do edifício espiritual no qual é oferecido ao Deus vivente o culto em espírito e verdade (cf. 1Pd 2,4; Ef 2,20). Por isso, o altar, centro para o qual nas nossas igrejas converge a atenção, é dedicado, ungido com o crisma, incensado, beijado, venerado: para o altar se orienta o olhar dos orantes, sacerdotes e fiéis, convocados para a santa assembleia em volta do mesmo; em cima do altar é colocada a oferta da Igreja que o Espírito consagra como sacramento do sacrifício de Cristo; do altar nos são distribuídos o pão da vida e o cálice da salvação «para que, em Cristo, nos tornemos um só corpo e um só espírito» (Oração Eucarística III)”.
Essa fala do Papa nos remete aqui a devida ordem do presbitério e o devido decoro que cabe a ordenação das coisas do altar. A Constituição Sacrosanctum Concilium fala da reforma dos livros litúrgicos, mas também do “conjunto das coisas externas que se referem ao culto sagrado, especialmente quanto à digna e funcional construção das igrejas, à forma e edificação dos altares, à nobreza, disposição e segurança do tabernáculo eucarístico, à conveniência e honra do batistério, bem como à conveniente colocação das sagradas imagens, da decoração e ornamentação. O que parecer convir menos à reforma da Liturgia, seja emendado ou abolido; o que, porém, a favorecer, seja mantido ou introduzido” (SC, 128).
Não se improvisa um presbitério, mas se prevê as coisas ordenadamente, com zelo. Quantos presbitérios hoje vemos tão desproporcionais, tão cheio de imagens e folhagens, que impedem a centralidade do altar. Temos que rever e sentir que o menos aqui é mais. Há, tantas vezes poluição, não sonora, mas visual. Tudo distrai, tudo desfoca para o centro principal que é o altar.

15/08/2018

Temos dedicado alguns programas deste nosso espaço ao discurso do Papa Francisco aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional, realizada em 24 de agosto de 2017. Na última quarta-feira, falamos que “sem a presença real do mistério de Cristo, não há qualquer vitalidade litúrgica” e recordamos outro aspecto abordado pelo Santo Padre, “a visibilidade e centralidade do altar”. No programa de hoje, padre Gerson Schmidt, que tem nos acompanhado neste percurso dos documentos do evento conciliar, nos traz a reflexão “Liturgia, ação do povo fiel”:
Finalmente ainda queremos destacar mais um ponto, quando Sumo Pontífice Papa Francisco realizou no discurso aos participantes na 68ª Semana Litúrgica Nacional na Itália, em 24 de agosto de 2017.
O Papa lembrou a etimologia da palavra Liturgia, liturgein – que significa ação do povo: “A liturgia é vida para todo o povo da Igreja. Com efeito, por sua natureza, a Liturgia é ‘popular’ e não clerical, sendo - como ensina a etimologia - uma ação para o povo, mas também do povo. Como recordam tantas orações litúrgicas, é a ação que o próprio Deus cumpre a favor do seu povo, mas também a ação do povo que ouve Deus que fala e reage louvando-o, invocando-o, acolhendo a fonte inexaurível de vida e de misericórdia que flui dos santos sinais.
A Igreja em oração congrega todos aqueles que têm o coração à escuta do Evangelho, sem rejeitar ninguém: são convocados pequenos e grandes, ricos e pobres, crianças e idosos, sadios e doentes, justos e pecadores – tal qual já dizia São Justino da apologia que fez eucaristia nos primeiros séculos, que está descrita na Catecismo.
À imagem da ‘multidão imensa’ que celebra a Liturgia no santuário do céu (cf. Ap 7,9), a assembleia litúrgica supera, em Cristo, qualquer limite de idade, raça, língua e nação.
O alcance ‘popular’ da Liturgia recorda-nos que ela é inclusiva e não exclusiva, promotora de comunhão com todos sem todavia homologar, pois chama cada um, com a sua vocação e originalidade, a contribuir para edificar o corpo de Cristo: «A Eucaristia não é um sacramento ‘para mim’, é o sacramento de muitos que formam um só corpo, o santo povo fiel de Deus». Por conseguinte, não devemos esquecer que é antes de tudo a liturgia que expressa a pietas de todo o povo de Deus, prolongada depois por piedosos exercícios e devoções que conhecemos com o nome de piedade popular, que devemos valorizar em harmonia com a liturgia”.
A celebração eucarística, portanto, não é uma ação isolada, do sacerdote a Deus, para cumprir um preceito ou sacrifício meritório. A Constituição Sacrosanctum Concilium, nos números 33-34 lembra isso, nesses termos: “Embora a Sagrada Liturgia seja principalmente culto da majestade divina, é também grande fonte de instrução para o povo fiel. Efetivamente, na liturgia Deus fala ao seu povo, e Cristo continua a anunciar o Evangelho. Por seu lado, o povo responde a Deus com o canto e a oração. Mais, as orações dirigidas a Deus pelo sacerdote que preside à comunidade na pessoa de Cristo, são rezadas em nome de todo o povo santo e de todos os que estão presentes” (SC, 33-34).
Vale a pena repetir as incisivas palavras do Papa de que a Liturgia é “inclusiva e não exclusiva, promotora de comunhão com todos sem todavia homologar, pois chama cada um, com a sua vocação e originalidade, a contribuir para edificar o corpo de Cristo. A Eucaristia não é um sacramento ‘para mim’, é o sacramento de muitos que formam um só corpo, o santo povo fiel de Deus”.
Aliás, se lemos a Sacrossanctum Concilium, a palavra “povo” aparece inúmeras vezes, destacando essa preocupação dos padres conciliares na Liturgia como ação sacramental para o santo povo de Deus, num grande Corpo único de Cristo que celebra e caminha para o Pai.


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