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quinta-feira, 2 de maio de 2024

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Jesus Cristo 42

A quarta seção das Catequeses de São João Paulo II sobre a missão de Jesus Cristo, centrada no mistério do seu sacrifício, foi subdivida em três partes. Confira a seguir o início da 1ª parte, sobre o sentido e valor da Morte de Cristo (nn. 64-70).

Para acessar a postagem com a Introdução e o índice das Catequeses sobre o Creio do Papa polonês, clique aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO

IV. O sacrifício de Jesus Cristo
A. Sentido e valor da Morte de Cristo

64. Cristo, modelo do amor perfeito que atinge seu ápice no sacrifício da cruz
João Paulo II - 31 de agosto de 1988

1. A união filial de Jesus com o Pai se expressa no perfeito amor, que Ele constituiu como mandamento principal do Evangelho: “Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento. Este é o maior e o primeiro mandamento” (Mt 22,37s). Como sabemos, a esse mandamento Jesus une um segundo, “semelhante ao primeiro”: o do amor ao próximo (cf. Mt 22,39). E Ele mesmo se propõe como exemplo desse amor: “Eu vos dou um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros. Como Eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34). Ele ensina e entrega aos seus seguidores um amor exemplificado no modelo do seu amor.

A este amor podem ser certamente aplicadas as qualidades da caridade (do amor) enumeradas por São Paulo: “O amor é paciente, é benigno; não é invejoso, não é presunçoso nem arrogante... não é interesseiro... não leva em conta o mal sofrido... se alegra com a verdade. Tudo sofre... tudo suporta” (1Cor 13,4-7). Quando, na sua Carta, o Apóstolo apresentava aos seus destinatários de Corinto tal imagem da caridade evangélica, sua mente e seu coração certamente estavam impregnados pelo pensamento do amor de Cristo, para o qual desejava orientar a vida das comunidades cristãs, de modo que o seu “hino da caridade” pode ser considerado um comentário ao mandamento de amar segundo o modelo de Cristo-Amor (como dirá, tantos séculos depois, Santa Catarina de Siena): “Como Eu vos amei” (Jo 13,34).

Última Ceia (Antoni Estruch)
Note-se a sombra de Cristo, prefigurando a Paixão

São Paulo destaca em outros textos que o ápice desse amor é o sacrifício da cruz: “Sede, pois, imitadores de Deus como filhos queridos. Caminhai no amor, como Cristo também nos amou e se entregou a Deus por nós como oferenda e sacrifício” (Ef 5,1-2).
Para nós resulta agora instrutivo, construtivo e consolador considerar essas qualidades do amor de Cristo.

2. O amor com que Jesus nos amou é humilde e tem caráter de serviço. “O Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos” (Mc 10,45). Na véspera da Paixão, antes da instituição da Eucaristia, Jesus lava os pés dos Apóstolos e lhes diz: “Dei-vos o exemplo, para que também vós façais assim como Eu vos fiz” (Jo 13,15). E, em outra ocasião, lhes exorta: “Quem quiser ser o maior no meio de vós, seja aquele que serve, e quem quiser ser o primeiro no meio de vós, seja o servo de todos” (Mc 10,43-44).

3. À luz desse modelo de humilde disponibilidade que chega até o “serviço” definitivo da cruz, Jesus pode dirigir aos discípulos o seguinte convite: “Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração” (Mt 11,29).

O amor ensinado por Cristo se expressa no serviço recíproco, que leva a sacrificarmo-nos uns pelos outros, e cuja verificação definitiva está em oferecer a própria vida “pelos irmãos” (1Jo 3,16). É o que destaca São Paulo quando escreve que “Cristo amou a Igreja e se entregou por ela” (Ef 5,25).

4. Outra qualidade exaltada no hino paulino à caridade é que o verdadeiro amor “não é interesseiro” (1Cor 13,5). E nós sabemos que Jesus nos deixou o modelo mais perfeito desse amor desinteressado. São Paulo o diz claramente em outro texto: “Cada um de nós procure agradar ao próximo para o bem, visando à edificação. Com feito, Cristo também não procurou o que lhe agradava...” (Rm 15,2-3). No amor de Jesus se concretiza e atinge seu ápice o “radicalismo” evangélico das oito bem-aventuranças proclamadas por Ele: o heroísmo de Cristo será sempre o modelo das virtudes heroicas dos santos.

5. Sabemos, com efeito, que o evangelista João, quando nos apresenta Jesus às portas da Paixão, escreve que Ele “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Esse “até o fim” (“até o extremo”) parece testemunhar aqui o caráter definitivo e insuperável do amor de Cristo: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a própria vida por seus amigos” (Jo 15,13), diz o próprio Jesus no discurso relatado por seu discípulo amado.

O mesmo evangelista escreve na sua Carta: “Nisto conhecemos o amor: Jesus deu a vida por nós. Ora, também nós devemos dar a vida pelos irmãos” (1Jo 3,16). O amor de Cristo, que se manifestou definitivamente no sacrifício da cruz - ou seja, no “dar a vida pelos irmãos” -, é o modelo definitivo para todo amor humano autêntico. Se em não poucos seguidores do Crucificado esse amor alcança a forma do sacrifício heroico, como vimos muitas vezes na história da santidade cristã, essa medida da “imitação” do Mestre se explica pela força do Espírito de Cristo, d’Ele “enviado” desde o Pai também para os discípulos (cf. Jo 15,26).

6. O sacrifício de Cristo se tornou o “preço” e a “compensação” para a libertação do homem: a libertação da “escravidão do pecado” (cf. Rm 6,6-17), a passagem à “liberdade dos filhos de Deus” (Rm 8,21). Com este sacrifício, consequência do seu amor por nós, Jesus Cristo completou a sua missão salvífica. O anúncio de todo o Novo Testamento encontra sua expressão mais concisa naquela passagem do Evangelho de Marcos: “O Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos” (Mc 10,45).

A palavra “resgate” favoreceu a formação do conceito e da expressão “redenção” - em grego: lytron (λύτρον), resgate; lytrosis (λύτρωσις), redenção. Esta verdade central da nova aliança constitui ao mesmo tempo o cumprimento do anúncio profético de Isaías sobre o Servo do Senhor: “Ele foi ferido por causa de nossas iniquidades... por suas chagas fomos curados” (Is 53 5); “Ele carregava os pecados de muitos” (v. 12). Podemos afirmar que a redenção era a expectativa de toda a antiga aliança.

7. Assim, pois, “tendo amado até o fim” (cf. Jo 13,1) aqueles que o Pai lhe “confiou” (Jo 17,6), Cristo ofereceu a sua vida na cruz como “sacrifício pelos pecados” (segundo as palavras de Isaías). A consciência dessa tarefa, dessa missão suprema, esteve sempre presente no pensamento e na vontade de Jesus, como afirmam suas palavras sobre o “bom pastor” que “dá sua vida pelas ovelhas” (Jo 10,11). E também sua misteriosa, mas transparente, aspiração: “Tenho um batismo no qual devo ser batizado, e como me angustio até que se complete!” (Lc 12,50). E a suprema declaração sobre o cálice de vinho durante a Última Ceia: “Este é o meu sangue da nova aliança, que é derramado em favor de muitos, para o perdão dos pecados” (Mt 26,28).

8. A pregação apostólica desde o princípio incute a verdade de que “Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras” (1Cor 15,3). Paulo o dizia claramente aos coríntios: “É isso que temos anunciado, é essa a fé que abraçastes” (v. 11). O mesmo pregava aos anciãos de Éfeso: “O Espírito Santo vos estabeleceu como guardiães, para apascentar a Igreja de Deus, que Ele adquiriu com o seu sangue” (At 20,28). E a pregação de Paulo está em perfeita consonância com a voz de Pedro: “Também Cristo padeceu, uma vez por todas, por causa dos pecados, o justo pelos injustos, a fim de nos conduzir a Deus” (1Pd 3,18). Paulo destaca a mesma ideia, ou seja, que em Cristo, “e por seu sangue, obtemos a redenção e recebemos o perdão de nossas faltas, segundo a riqueza da sua graça” (Ef 1,7).

Para sistematizar e dar continuidade a esse ensinamento, o Apóstolo proclama com resolução: “Nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios” (1Cor 1,23); “Pois o que é loucura de Deus é mais sábio que os homens, e o que é fraqueza de Deus é mais forte que os homens” (v. 25). O Apóstolo é consciente da “contradição” revelada na cruz de Cristo. Por que, pois, esta cruz é a suprema potência e sabedoria de Deus? A resposta é uma só: porque na cruz se manifestou o amor. “Deus prova o seu amor para conosco pelo fato de que Cristo morreu por nós, quando ainda éramos pecadores” (Rm 5,8); “Cristo nos amou e se entregou por nós” (Ef 5,2). As palavras de Paulo ecoam aquelas do próprio Cristo: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a própria vida” pelos pecados do mundo (cf. Jo 15,13).

9. A verdade sobre o sacrifício redentor de Cristo-Amor faz parte da doutrina contida na Carta aos Hebreus. Nesta Cristo é apresentado como “sumo sacerdote dos bens futuros”, que “entrou no santuário... com seu próprio sangue, uma vez por todas, obtendo uma redenção eterna” (Hb 9,11-12). Com efeito, Ele não apresentou aquele sacrifício ritual do sangue dos animais, que na antiga aliança era oferecido no santuário “feito por mãos humanas”: Ele ofereceu a si mesmo, transformando a própria morte violenta em meio de comunhão com Deus. Deste modo, por “aquilo que sofreu” (Hb 5,8), Cristo se tornou “causa de salvação eterna para todos os que lhe obedecem” (v. 9). Esse único sacrifício tem o poder de “purificar nossa consciência das obras mortas” (Hb 9,14). Só ele “levou à perfeição definitiva os que são por ele santificados” (Hb 10,14).

Nesse sacrifício, no qual Cristo, “em virtude do Espírito eterno, ofereceu a si mesmo a Deus” (Hb 9,14), seu amor encontrou expressão definitiva: o amor com que “amou até o fim” (Jo 13,1); o amor que o levou a “fazer-se obediente até a morte - e morte de cruz” (Fl 2,8).

65. O sacrifício de Cristo, cumprimento do desígnio de amor de Deus
João Paulo II - 07 de setembro de 1988

1. Na missão messiânica de Jesus há um ponto culminante e central, ao qual fomos nos aproximando pouco a pouco nas Catequeses anteriores: Cristo foi enviado por Deus ao mundo para realizar a redenção do homem mediante o sacrifício da própria vida. Este sacrifício devia tomar a forma de um “despojamento” de si na obediência até a morte na cruz: uma morte que, na opinião dos seus contemporâneos, apresentava uma particular dimensão de ignomínia.

Em toda a sua pregação, em todo o seu comportamento, Jesus é guiado pela profunda consciência que possui dos desígnios de Deus sobre sua vida e sua morte na economia da missão messiânica, com a certeza de que esses desígnios brotam do amor eterno do Pai pelo mundo e em particular pelo homem.

2. Se consideramos os anos da sua adolescência, dão muito o que pensar aquelas palavras de Jesus aos doze anos, dirigidas a Maria e a José no momento do seu “reencontro” no templo de Jerusalém: “Não sabíeis que Eu devo estar naquilo que é de meu Pai?” (Lc 2,49). Que tinha na mente e no coração? Podemos deduzi-lo de muitas outras expressões do seu pensamento ao longo de toda a sua vida pública. Desde o início da sua atividade messiânica, Jesus insiste em inculcar em seus discípulos a ideia de que “o Filho do Homem deve sofrer muito” (Lc 9,22), isto é, que deve ser “rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos escribas, ser morto e, ao terceiro dia, ressuscitar” (Mc 8,31). Mas tudo isso não procede só dos homens, da sua hostilidade em relação à pessoa e ao ensinamento de Jesus, mas constitui o cumprimento dos desígnios eternos de Deus, como anunciado pelas Escrituras que continham a revelação divina: “Está escrito que o Filho do homem deve sofrer muito e ser desprezado” (Mc 9,12).

3. Quando Pedro tenta negar esta eventualidade - “Que isso nunca te aconteça!” (Mt 16,22) -, Jesus lhe repreende com palavras particularmente severas: “Vai para longe de mim, Satanás! Tu não pensas de acordo com Deus, mas de acordo com os homens!” (Mc 8,33). É impressionante a eloquência dessas palavras, com as quais Jesus quer dar a entender a Pedro que se opor ao caminho da cruz significa rejeitar os desígnios do próprio Deus. “Satanás” é precisamente aquele que “desde o princípio” se opõe ao “que é de Deus”.

4. Jesus, portanto, é consciente da responsabilidade dos homens pela sua morte na cruz, que deverá enfrentar devido a uma condenação pronunciada por tribunais terrenos; mas também é consciente de que por meio dessa condenação humana se cumprirá o desígnio eterno de Deus: aquilo “que é de Deus”, isto é, o sacrifício oferecido sobre a cruz para a redenção do mundo. E ainda que Jesus (como o próprio Deus) não queira o mal do “deicídio” cometido pelos homens, aceita este mal para tirar dele o bem da salvação do mundo.

5. Após a Ressurreição, caminhando até Emaús com dois dos seus discípulos sem ser reconhecido, lhes explica as “Escrituras” do Antigo Testamento nesses termos: “Não era necessário que o Cristo sofresse tudo isso, para entrar em sua glória?” (Lc 24,26). E no seu último encontro com os Apóstolos, declara: “Era necessário que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” (v. 44).

6. À luz dos acontecimentos pascais, os Apóstolos compreendem o que Jesus lhes havia dito anteriormente. Pedro, que por amor ao Mestre, mas também pela falta de compreensão, parecera se opor de modo particular ao seu destino cruel, dirá aos seus ouvintes de Jerusalém no dia de Pentecostes, falando de Cristo: “Deus, em seu desígnio e previsão, quis que Jesus fosse entregue pelas mãos dos ímpios, e vós o matastes, pregando-o numa cruz” (At 2,23). E acrescentará: “Deus cumpriu desse modo o que havia anunciado pela boca de todos os profetas: que o seu Cristo haveria de sofrer” (At 3,18).

7. A Paixão e a Morte de Cristo foram anunciadas no Antigo Testamento não como o final da sua missão, mas como a “passagem” indispensável requerida para ser exaltado por Deus. Afirma-o especialmente o cântico de Isaías, falando do Servo de Yahweh como “homem das dores”: “Vede! O meu servo prosperará, será exaltado, elevado, e muito sublime” (Is 52,13). E o próprio Jesus, quando adverte que “o Filho do homem... será morto”, acrescenta que “ao terceiro dia, ressuscitará” (Mc 8,31).

8. Encontramo-nos, portanto, diante de um desígnio divino que, embora pareça tão evidente, considerado no decurso dos acontecimentos descritos pelos Evangelhos, permanece sempre um mistério que não pode ser explicado de maneira exaustiva pela razão humana. É com este espírito que o Apóstolo Paulo se expressa com aquele magnífico paradoxo: “Pois o que é loucura de Deus é mais sábio que os homens, e o que é fraqueza de Deus é mais forte que os homens” (1Cor 1,25). Estas palavras de Paulo sobre a cruz de Cristo são insubstituíveis. Mas também é verdade que se é difícil para o homem encontrar uma resposta racionalmente satisfatória à pergunta “Por que a cruz de Cristo?”, a resposta nos é oferecida mais uma vez pela Palavra de Deus.

9. O próprio Jesus formula a resposta: “De tal modo Deus amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que n’Ele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). Quando Jesus pronuncia essas palavras no diálogo noturno com Nicodemos, seu interlocutor provavelmente não podia supor ainda que a frase “dar o seu Filho” significava “entregá-lo à morte na cruz”. Mas João, que a narra no seu Evangelho, conhecia bem seu significado. O desenrolar dos acontecimentos demostrou que esse era precisamente o sentido da resposta a Nicodemos: Deus “deu” o seu Filho Unigênito para a salvação do mundo entregando-o à morte de cruz pelos pecados do mundo, entregando-o por amor: “De tal modo Deus amou o mundo”, a criação, o homem! O amor permanece a explicação definitiva da redenção mediante a cruz. É a única resposta à pergunta “por quê?” a respeito da morte de Cristo compreendida no desígnio eterno de Deus.

O autor do Quarto Evangelho, onde encontramos o texto da resposta de Cristo a Nicodemos, retomará a mesma ideia em uma de suas Cartas: “Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi Ele que nos amou e enviou o seu Filho como oferenda de expiação pelos nossos pecados” (1Jo 4,10).

10. Trata-se de um amor que supera a própria justiça. A justiça pode dizer respeito e atingir aquele que cometeu uma falta. Se o que sofre é um inocente, então não se trata de justiça. Se um inocente que é santo, como Cristo, se entrega livremente ao sofrimento e à morte de cruz para cumprir o desígnio eterno do Pai, significa que, no sacrifício do seu Filho, Deus em certo sentido vai além da ordem da justiça, para revelar-se neste Filho e por meio d’Ele com toda a riqueza da sua misericórdia - “Dives in misericórdia” (Ef 2,4) -, como para introduzir, junto a este Filho Crucificado e Ressuscitado, sua misericórdia, seu amor misericordioso, na história das relações entre o homem e Deus.

Precisamente por meio desse amor misericordioso o homem é chamado a vencer o mal e o pecado em si mesmo e em relação aos outros: “Bem-aventurados os misericordiosos, pois alcançarão misericórdia” (Mt 5,7). “A prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós, quando ainda éramos pecadores”, escreve São Paulo (cf. Rm 5,8).

11. O Apóstolo retoma esse tema em diversos pontos das suas Cartas, nas quais aparece com frequência o trinômio redenção - justiça - amor.
“Todos pecaram e estão privados da glória de Deus. Esses são justificados gratuitamente pela graça de Deus, por meio da redenção em Cristo Jesus... com o seu sangue” (Rm 3,23-25). Deus demonstra assim que não deseja contentar-se com o rigor da justiça, que, vendo o mal, o castiga, mas que deseja triunfar sobre o pecado de outro modo, isto é, oferecendo ao homem a possibilidade de sair dele. Deus quis mostrar-se justo de forma positiva, dando aos pecadores a possibilidade de se tornarem justos por meio da sua adesão de fé a Cristo Redentor. Assim, Deus “é justo e torna justos” (Rm 3,26). Isso se realiza de modo desconcertante, pois “Aquele que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós, para que n’Ele nos tornemos justiça de Deus” (2Cor 5,21).

12. Aquele que “não conheceu pecado”, o Filho consubstancial ao Pai, carregou sobre si o terrível jugo do pecado de toda a humanidade, para obter nossa justificação e santificação. Este é o amor de Deus revelado no Filho. Por meio do Filho se manifestou o amor do Pai, “que não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós” (Rm 8,32). Para compreender o alcance dessas palavras: “não poupou”, pode nos ajudar a recordação do sacrifício de Abraão, que se mostrou disposto a “não poupar seu filho amado” (cf. Gn 22,16); Deus, porém, o poupou (v. 12). Ao contrário, a seu próprio Filho Deus “não poupou, mas o entregou” à morte para nossa salvação.

13. Daqui brota a certeza do Apóstolo de que nada nem ninguém, “nem a morte, nem a vida, nem os anjos... nem outra criatura qualquer será capaz de nos separar do amor de Deus, manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8,38-39). Junto com Paulo, a Igreja inteira está segura desse amor de Deus “que supera tudo”, última palavra da autorrevelação de Deus na história do homem e do mundo, suprema autocomunicação que ocorre mediante a cruz, no centro do Mistério Pascal de Jesus Cristo.

Jesus em oração no Getsêmani (Vasily Perov)

Tradução nossa a partir do texto italiano divulgado no site da Santa Sé (31 de agosto e 07 de setembro de 1988).

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