Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 19 de Agosto de 2015
A Família (24):
Família e trabalho
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Depois de ter reflectido sobre o valor da festa na vida da família, hoje
meditemos sobre o elemento complementar, que é o trabalho. Ambos fazem
parte do desígnio criador de Deus, a festa e o trabalho.
O trabalho, diz-se normalmente, é necessário para manter a família,
criar os filhos, garantir aos próprios entes queridos uma vida digna. De uma
pessoa séria, honesta, o que de mais bonito se possa dizer é: «É um
trabalhador», precisamente uma pessoa que trabalha, que na comunidade não vive
às custas dos outros. Há muitos argentinos aqui, vejo-vos, e direi como dizemos
nós: «No vive de arriba».
Com efeito, o trabalho nas suas mil formas, a partir daquele doméstico,
cuida também do bem comum. E onde se aprende este estilo de vida laboriosa?
Antes de mais aprende-se em família. A família educa para o trabalho
com o exemplo dos pais: pai e mãe que trabalham para o bem da família e da
sociedade.
No Evangelho, a Sagrada Família de Nazaré aparece como uma família de
trabalhadores, e o próprio Jesus é chamado «filho do carpinteiro» (cf. Mt 13,55) ou até «o carpinteiro» (cf. Mc 6,3). São Paulo não deixa
de advertir os cristãos: «Quem não quiser trabalhar, não tem o direito de
comer» (2Ts 3,10). Esta é uma boa receita para emagrecer, não
trabalhas, não comes! O apóstolo refere-se explicitamente ao falso
espiritualismo de alguns que, de facto, vivem às custas dos seus irmãos e irmãs
«ocupando-se de futilidades» (2Ts 3,11). O compromisso do
trabalho e a vida do espírito, na concepção cristã, não estão absolutamente em
contraste entre si. É muito importante entender isto! Oração e trabalho podem e
devem estar juntos, em harmonia, como ensina são Bento. A falta de trabalho
prejudica também o espírito, assim como a falta de oração deteriora inclusive a
atividade prática.
Trabalhar - repito, nas suas mil formas - é próprio da pessoa humana.
Exprime a sua dignidade de ter sido criada à imagem de Deus. Por isso, diz-se
que o trabalho é sagrado. E portanto a gestão do emprego é uma grande
responsabilidade humana e social, que não pode ser deixada nas mãos de poucos
nem acabar num «mercado» divinizado. Causar uma perda de lugares de trabalho
significa provocar um grave dano social. Entristeço-me quando vejo que há
pessoas sem trabalho, que não encontram emprego e não têm a dignidade de levar
o pão para casa. Alegro-me muito quando vejo que os governantes fazem grandes
esforços para criar postos de trabalho a fim de que todos o tenham. Ele é
sagrado, confere dignidade à família. Devemos rezar para que não falte trabalho
na família.
Por conseguinte, também o trabalho, como a festa, faz parte do desígnio
de Deus Criador. No livro do Gênesis, o tema da terra como casa-jardim,
confiada aos cuidados e ao trabalho do homem (cf. 2,8.15), é antecipado com um
trecho muito comovedor: «Quando o Senhor Deus fez a terra e os céus, não havia
arbusto algum pelos campos, nem sequer uma planta germinara ainda, porque o
Senhor Deus não tinha feito chover sobre a terra e não havia homem para a
cultivar. Mas da terra elevava-se um vapor que regava toda a superfície» (2,5-6). Não é romantismo, é revelação de Deus; e nós temos a responsabilidade de
a compreender e assimilar até ao fundo. A Encíclica Laudato si’, que propõe uma ecologia
integral, contém também esta mensagem: a beleza da terra e a dignidade do
trabalho existem para estar juntas. Caminham juntas: a terra torna-se bonita
quando é trabalhada pelo homem. Quando o trabalho se afasta da aliança de Deus
com o homem e a mulher, quando se separa das suas qualidades espirituais,
quando é refém só da lógica do lucro e despreza os afetos da vida, o
aviltamento da alma contamina tudo: inclusive o ar, a água, as ervas, os alimentos...
A vida civil corrompe-se e o habitat deteriora-se. E as
consequências atingem sobretudo os mais pobres e as famílias mais pobres. A
moderna organização do trabalho às vezes mostra uma perigosa tendência a
considerar a família como um obstáculo, um peso, uma passividade, para a
produtividade do trabalho. Mas esquecemo-nos: qual produtividade? E para quem?
A chamada «cidade inteligente» sem dúvida é rica de serviços e organização;
contudo, por exemplo, com frequência é hostil a crianças e idosos.
Às vezes quem projeta está interessado na gestão da força de trabalho
individual, para montar e utilizar ou descartar de acordo com a conveniência
econômica. A família é um grande teste. Quando a organização do trabalho a
mantém refém, ou até lhe impede o caminho, então estamos certos de que a
sociedade humana começou a agir contra si mesma!
As famílias cristãs recebem desta conjuntura um grande desafio e uma
grande missão. Elas apresentam os fundamentos da criação de Deus: a identidade
e o vínculo do homem e da mulher, a geração dos filhos, o trabalho que torna a
terra doméstica e habitável. A perda desses fundamentos é um problema muito
sério, e já temos demasiadas fendas na casa comum! A tarefa não é fácil. Às
vezes as associações de famílias podem ter a impressão de ser como David diante
de Golias... mas sabemos como se concluiu aquele desafio! São necessárias fé e
astúcia. Deus nos conceda receber com alegria e esperança a sua chamada, neste
momento difícil da nossa história, a chamada ao trabalho para dar dignidade a
nós mesmos e à própria família.
Fonte: Santa Sé
Nenhum comentário:
Postar um comentário