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sábado, 13 de janeiro de 2024

Visita do Papa Bento XVI ao Santuário da Santa Face de Manoppello

O II Domingo do Tempo Comum (antigo II Domingo após a Epifania) também é conhecido como Domingo “Omnis terra”, em referência à antífona de entrada tomada do Sl 65,4: “Omnis terra adóret te, Deus...” (“Toda terra te adore, ó Deus...”).

No tempo do Papa Inocêncio III (1216) esse domingo era dedicado à devoção à Santa Face de Jesus, com uma procissão da Basílica de São Pedro até a igreja do Espírito Santo in Sassia, junto à qual funcionava um hospital, exortando assim a ver a face de Cristo no rosto dos irmãos sofredores (cf. Mt 25,31-46).

Para celebrar esse domingo, propomos aqui o discurso do Papa Bento XVI (†2022) durante sua visita ao Santuário da Santa Face de Manoppello, na região italiana dos Abruzos, no dia 01 de setembro de 2006.

Visita ao Santuário da Santa Face de Manoppello
Discurso do Papa Bento XVI
Sexta-feira, 01 de setembro de 2006

Queridos irmãos e irmãs!
Antes de tudo, desejo mais uma vez agradecer profundamente este acolhimento, as suas palavras, Excelência [Dom Bruno Forte, Arcebispo de Chieti-Vasto], tão profundas, tão cordiais, a expressão da sua amizade, da vossa amizade, e os dons de grandíssimo significado: a Face de Cristo que aqui se venera, para mim, para a minha casa, e depois estes dons da vossa terra, que expressam a beleza e a bondade da terra, dos homens que vivem e trabalham aqui, e a beleza e bondade do próprio Criador.

Bento XVI venera a “Santa Face de Manoppello”

Desejo simplesmente agradecer ao Senhor o encontro de hoje, simples e familiar, em um lugar onde podemos meditar sobre o mistério do amor divino, contemplando o ícone da Santa Face. A todos vós aqui presentes dirijo o meu agradecimento mais sentido pelo vosso cordial acolhimento e pelo empenho e discrição com que favorecestes esta peregrinação particular, que, contudo, como peregrinação eclesial não pode ser totalmente particular. Saúdo e agradeço, repito, em particular ao vosso Arcebispo, amigo desde muitos anos. Colaboramos na Comissão Teológica Internacional. E em tantos diálogos aprendi sempre da sua sabedoria, e também dos seus livros. Obrigado pelos dons que me oferecestes e que aprecio muito precisamente na sua qualidade de “sinais”, como os chamou Dom Bruno Forte.

De fato, eles são sinais da comunhão afetiva e efetiva que liga o povo desta querida terra dos Abruzos ao Sucessor de Pedro. Dirijo uma saudação especial a vós, sacerdotes, religiosos, religiosas e seminaristas aqui reunidos. Sinto-me particularmente feliz por ver um grande número de seminaristas, por conseguinte o futuro da Igreja presente entre nós. Não sendo possível encontrar toda a Comunidade diocesana - talvez seja na próxima - sinto-me feliz que vós a representeis aqui, vós, que sois pessoas já dedicadas ao ministério presbiteral e à vida consagrada ou encaminhadas para o sacerdócio.

Pessoas que me apraz considerar apaixonadas por Cristo, atraídas por Ele e comprometidas a fazer da própria existência uma busca contínua da Santa Face. Por fim, dirijo uma grata saudação à comunidade dos Padres Capuchinhos, que nos hospeda, e que há séculos se ocupa deste Santuário, meta de tantos peregrinos.

Há pouco, quando estava em oração, pensei nos dois primeiros Apóstolos que, impelidos por João Batista, seguiram Jesus nas proximidades do rio Jordão como lemos no início do Evangelho de João (Jo 1,35-42). O evangelista narra que Jesus se voltou e lhes perguntou: “O que estais procurando?”. Eles responderam: “Rabi, Mestre, onde moras?”. Ele respondeu: “Vinde ver” (vv. 38-39). Naquele mesmo dia os dois que O seguiram fizeram uma experiência inesquecível, que os fez dizer: “Encontramos o Messias” (v. 41). Aquele que pouco tempo antes consideravam um simples “rabi”, tinha adquirido uma identidade bem definida, a do Cristo esperado há séculos.

Mas, na realidade, quanto caminho tinham ainda diante de si aqueles discípulos! Nem sequer podiam imaginar quão profundo seria o mistério de Jesus de Nazaré; quanto se poderia revelar imperscrutável o seu “rosto”. A ponto que, depois de ter vivido junto com ele três anos, Filipe, um deles, ouvirá na Última Ceia: “Há tanto tempo estou convosco, e não me conheces, Filipe?”. E depois aquelas palavras que expressam toda a novidade da revelação de Jesus: “Quem me vê, vê o Pai” (Jo 14,9).

Só depois da sua Paixão, quando o encontrarem Ressuscitado, quando o Espírito iluminar as suas mentes e os seus corações, os Apóstolos compreenderão o significado das palavras que Jesus tinha dito, e O reconhecerão como o Filho de Deus, o Messias prometido para a redenção do mundo. Então se tornarão seus mensageiros infatigáveis, testemunhas corajosas até ao martírio.

“Quem me vê, vê o Pai”. Sim, queridos irmãos e irmãs, para “ver Deus” é preciso conhecer Cristo e deixar-se plasmar pelo seu Espírito, que guia os que creem “à plena verdade” (Jo 16,13).


Quem encontra Jesus, quem se deixa atrair por Ele e está disposto a segui-lo até o sacrifício da vida, experimenta pessoalmente, como Ele fez na cruz, que só o “grão de trigo” que é lançado à terra e morre, “dá muito fruto” (Jo 12,24). Esse é o caminho de Cristo, o caminho do amor total que vence a morte: quem o percorrer e desprezar “a si mesmo, neste mundo, assegura para si a vida eterna” (Jo 12,25). Isto é, vive em Deus já nesta terra, atraído e transformado pelo esplendor do seu rosto. Esta é a experiência dos verdadeiros amigos de Deus, os santos, que reconheceram e amaram nos irmãos, especialmente nos mais pobres e necessitados, o rosto daquele Deus longamente contemplado com amor na oração.

Eles são para nós exemplos encorajadores a ser imitados; garantem-nos que se percorrermos com fidelidade este caminho, o caminho do amor, também nós, como canta o salmista, “nos saciaremos da presença de Deus” (cf. Sl 16,15).

Jesu... quam bonus te quaerentibus!” - “Jesus, quanto és bom para quem te procura!”: assim cantamos há pouco executando o antigo hino “Jesu, dulcis memoria”, que alguns atribuem a São Bernardo. É um hino que adquire eloquência particular neste santuário dedicado à Santa Face e que recorda o Salmo 23: esta é “a geração dos que o procuram, e do Deus de Israel buscam a face” (v. 6). Mas qual é a “geração” que procura o rosto de Deus, qual geração é digna de “subir até o monte do Senhor”, de “ficar em sua santa habitação”? O salmista explica: são aqueles que têm “mãos puras e inocente coração”, que não dizem mentiras, que não juram falso contra o próximo (vv. 3-4).

Portanto, para entrar em comunhão com Cristo e contemplar o seu rosto, para reconhecer o rosto do Senhor no dos irmãos e nas vicissitudes de todos os dias, são necessárias “mãos puras e corações inocentes”. Mãos puras, isto é, existências iluminadas pela verdade do amor que vence a indiferença, a dúvida, a mentira e o egoísmo; e além disso, são necessários corações inocentes, corações arrebatados pela beleza divina, como diz a pequena Teresa de Lisieux na sua oração à Santa Face, corações que têm impresso o rosto de Cristo.

Queridos sacerdotes, se permanecer impressa em vós, pastores do rebanho de Cristo, a santidade da sua face, não tenhais receio, também os fiéis confiados aos vossos cuidados serão por Ele contagiados e transformados. E vós, seminaristas, que vos preparais para ser guias responsáveis do povo cristão, não vos deixeis atrair por mais nada a não ser por Jesus e pelo desejo de servir a sua Igreja.

Também a vós, religiosos e religiosas, gostaria de dizer o mesmo, para que cada uma das vossas atividades seja um reflexo visível da bondade e da misericórdia divina. “Senhor, é vossa face que eu procuro” (Sl 26,8): procurar a face de Jesus deve ser o anseio de todos nós, cristãos; de fato, nós somos a “geração” que neste tempo procura a sua face, o rosto do “Deus de Israel”. Se perseverarmos na busca da face do Senhor, no final da nossa peregrinação terrena será Ele, Jesus, a nossa alegria eterna, a nossa recompensa e glória para sempre: “Sis Jesu nostrum, qui es futurus praemium: sit nostra in te gloria, per cuncta semper saecula” - “Sê, Jesus, nossa alegria, Tu que serás nosso prêmio futuro: que a nossa glória repouse em ti, pelos séculos dos séculos”.

Foi esta certeza que animou os santos da vossa região, entre os quais me apraz citar particularmente Gabriel da Virgem Dolorosa e Camillo de Lellis; a eles dirigimos a nossa recordação reverente e a nossa oração. Mas dirigimos agora um pensamento de especial devoção à “Rainha de todos os santos”, a Virgem Maria, que vós venerais em diversos santuários e capelas espalhados nos vales e montes dos Abruzos. Que ela, em cujo rosto mais do que em qualquer outra criatura se veem os traços do Verbo Encarnado, vigie sobre as famílias e paróquias, sobre as cidades e nações de todo o mundo.

Ajude-nos a Mãe do Criador a respeitar também a natureza, grande dom de Deus que podemos admirar olhando para as maravilhosas montanhas que nos circundam. Mas este dom está sempre exposto a sérios riscos de degradação ambiental e por isso deve ser defendido e tutelado. Trata-se de uma urgência que, como observou Dom Bruno Forte, é oportunamente realçada pelo Dia de reflexão e oração pelo cuidado da criação, que é celebrado precisamente hoje pela Igreja italiana.

Queridos irmãos e irmãs, ao agradecer mais uma vez a vossa presença e os vossos dons, invoco sobre todos vós e vossos familiares a bênção de Deus com a antiga fórmula bíblica: “O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e se compadeça de ti. O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!” (Nm 6, 24-26). Amém!


Fonte: Santa Sé.

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