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domingo, 31 de dezembro de 2023

Homilia do Papa Bento XVI: Vésperas no encerramento do ano de 2011

Há um ano do falecimento do Papa Bento XVI (†2022), recordamos aqui suas palavras no dia 31 de dezembro de 2011 nas I Vésperas da Solenidade da Santa Mãe de Deus com o canto do hino Te Deum em ação de graças pelo encerramento do ano:

I Vésperas da Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus
Te Deum em ação de graças pelo encerramento do ano
Homilia do Papa Bento XVI
Basílica Vaticana
Sábado, 31 de dezembro de 2011

Senhores Cardeais,
Venerados Irmãos no Episcopado e no Presbiterado,
Ilustres Autoridades,
Queridos irmãos e irmãs!
Estamos reunidos na Basílica Vaticana para celebrar as I Vésperas da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, e para agradecer ao Senhor, no final do ano, cantando juntos o Te Deum. Agradeço a todos vós que quisestes unir-vos a mim nesta circunstância tão cheia de sentimentos e significado. Saúdo, em primeiro lugar, os senhores Cardeais, os venerados Irmãos no Episcopado e no Presbiterado, os religiosos e religiosas, as pessoas consagradas e os fiéis leigos que representam toda a comunidade eclesial de Roma. De modo especial, saúdo as Autoridades presentes, começando pelo Prefeito de Roma, a quem agradeço o cálice que doou, segundo uma bela tradição que se renova cada ano. Desejo de coração que, com o esforço de todos, a fisionomia da nossa cidade possa estar sempre mais em conformidade com os valores de fé, cultura e civilização que pertencem à sua vocação e história milenária.

"Qual é o sentido que podemos dar aos nossos dias?
A resposta está no rosto do Menino"

Outro ano chega à sua conclusão enquanto que, com a inquietação, os desejos e as expectativas de sempre, esperamos um novo. Se pensarmos na experiência da vida, ficamos admirados de como ela é, no fundo, breve e fugaz. Por isso, muitas vezes nos questionamos: qual é o sentido que podemos dar aos nossos dias? Mais concretamente, qual é o sentido que podemos dar aos dias de fadiga e de dor? Esta é uma pergunta que atravessa a história, antes, atravessa o coração de cada geração e de cada ser humano. Mas existe uma resposta para esta pergunta: está escrita no rosto de um Menino que nasceu há dois mil anos, em Belém, e que hoje é o Vivente, ressuscitado para sempre da morte. No tecido da humanidade, rasgado por tantas injustiças, maldades e violências, surge de modo surpreendente a novidade, alegre e libertadora, de Cristo Salvador, que no mistério da sua Encarnação e do seu nascimento nos permite contemplar a bondade e a ternura de Deus. Deus eterno entrou na nossa história e permanece presente de modo único na pessoa de Jesus, o seu Filho feito homem, nosso Salvador, que veio à terra para renovar radicalmente a humanidade e libertá-la do pecado e da morte, para elevar o homem à dignidade de filho de Deus. O Natal não se refere somente ao cumprimento histórico dessa verdade que nos toca diretamente, mas no-la dá novamente, de modo misterioso e real.

É muito sugestivo, neste fim de ano, escutar novamente o anúncio jubiloso que o Apóstolo Paulo dirigia aos cristãos da Galácia: «Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sujeito à Lei, para resgatar os que eram sujeitos à Lei, e para que todos recebêssemos a filiação adotiva» (Gl 4,4-5). Essas palavras tocam o cerne da história de todos e a iluminam, antes, a salvam, porque desde o dia em que nasceu o Senhor, chegou para nós a plenitude do tempo. Portanto, já não há mais lugar para a angústia diante do tempo que passa e não volta para trás; agora é o momento de confiar infinitamente em Deus, por quem sabemos ser amados, para quem vivemos e a quem a nossa vida se orienta, na espera do seu retorno definitivo. Desde que o Salvador desceu do Céu, o homem já não é mais escravo de um tempo que passa sem um porquê, ou marcado pela fadiga, pela tristeza, pela dor. O homem é filho de um Deus que entrou no tempo para resgatar o tempo da falta de sentido ou da negatividade, e que resgatou toda a humanidade, dando-lhe, como nova perspectiva de vida, o amor que é eterno.

A Igreja vive e professa esta verdade e quer proclamá-la novamente hoje, com renovado vigor espiritual. Nesta celebração temos motivos especiais para louvar o Senhor pelo seu mistério de salvação, presente no mundo por meio do ministério eclesial. Temos muitos motivos de agradecimento ao Senhor por tudo o que a nossa comunidade eclesial, no coração da Igreja universal, realiza a serviço do Evangelho nesta Cidade. A tal propósito, unido ao Cardeal Vigário, Agostino Vallini, aos Bispos Auxiliares, aos Párocos e todo o presbitério diocesano, quero dar graças ao Senhor, nomeadamente, pelo promissor caminho comunitário dirigido a adequar a pastoral ordinária às exigências do nosso tempo, por meio do projeto «Pertença eclesial e corresponsabilidade pastoral». Este tem o objetivo de colocar a evangelização em primeiro lugar; para fazer mais responsável e frutífera a participação dos fiéis nos Sacramentos, de tal forma que cada um possa falar de Deus ao homem contemporâneo e anunciar o Evangelho com eficácia aos que nunca o conheceram ou o esqueceram.

A questio fidei é também o desafio pastoral prioritário para a Diocese de Roma. Os discípulos de Cristo estão chamados a fazer renascer em si mesmos e nos demais a saudade de Deus e a alegria de viver n’Ele e de testemunhá-Lo, a partir da pergunta, sempre muito pessoal: Por que creio? É necessário conceder o primado à verdade, confirmar a aliança entre a fé e a razão, como as duas asas com as quais o espírito humano se eleva à contemplação da Verdade (cf. João Paulo II, Encíclica Fides et ratio, Prólogo); tornar fecundo o diálogo entre o Cristianismo e a cultura moderna; levar à redescoberta da beleza e da atualidade da fé, não como um ato em si mesmo, isolado, que diz respeito a algum momento da vida, mas como uma orientação constante, mesmo nas escolhas mais simples, que leva à unidade profunda da pessoa, tornando-a justa, ativa, benéfica, boa. Trata-se de reavivar uma fé que instaure um novo humanismo capaz de gerar cultura e empenho social.

Neste quadro geral, na Assembleia Diocesana do passado mês de junho, a Diocese de Roma iniciou um caminho de aprofundamento sobre a Iniciação Cristã e sobre a alegria de gerar novos cristãos para a fé. De fato, anunciar a fé no Verbo feito carne é o cerne da missão da Igreja, e toda a comunidade eclesial deve redescobrir esta tarefa, com um renovado ardor missionário. As novas gerações que mais sentem a desorientação, acentuada também pela crise atual, não só econômica, mas também de valores, têm necessidade, sobretudo, de reconhecer em Cristo Jesus «a chave, o centro e o fim de toda a história humana» (Concílio Vaticano II, Constituição Gaudium et spes, 10).

Os pais são os primeiros educadores na fé dos seus filhos desde a mais terna idade; por isso, é necessário apoiar as famílias na sua missão educativa, por meio de iniciativas adequadas. Ao mesmo tempo, é desejável que o caminho batismal, primeira etapa do itinerário formativo da Iniciação Cristã, além de favorecer uma consciente e digna preparação para a celebração do Sacramento, dê a devida atenção aos anos imediatamente sucessivos ao Batismo, com os itinerários apropriados que levem em conta as condições de vida das famílias. Animo, portanto, as comunidades paroquiais e as outras realidades eclesiais a continuarem refletindo para promover uma melhor compreensão e recepção dos Sacramentos através dos quais o homem se torna participante da vida mesma de Deus. Que a Igreja de Roma possa sempre contar com fiéis leigos, prontos a oferecer a sua contribuição pessoal para edificar comunidades vivas, que permitam que a Palavra de Deus entre no coração dos que ainda não conheceram o Senhor ou se afastaram d’Ele. Ao mesmo tempo, é oportuno criar ocasiões de encontro com a Cidade, que permitam um diálogo proveitoso com todos os que estão à procura da Verdade.

Queridos amigos, desde que Deus mandou o seu Filho Unigênito para que nós pudéssemos ter a filiação adotiva (cf. Gl 4,5), não pode existir para nós uma tarefa mais importante que estar totalmente a serviço do projeto divino. Neste sentido, quero animar e agradecer todos os fiéis da Diocese de Roma, que sentem a responsabilidade de devolver a alma à nossa sociedade. Obrigado a vós, famílias romanas, células primeiras e fundamentais da sociedade! Obrigado aos membros das muitas Comunidades, Associações e Movimentos comprometidos em animar a vida cristã da nossa cidade!

«Te Deum laudamus!», «A Vós, ó Deus, louvamos!». A Igreja nos sugere concluir o ano dirigindo ao Senhor o nosso agradecimento por todos os seus benefícios. É em Deus que deve terminar a nossa última hora, a última hora do tempo e da história. Esquecer este final da nossa vida significaria cair no vazio, viver sem sentido. Por isso, a Igreja coloca nos nossos lábios o antigo hino Te Deum. É um hino repleto da sabedoria de tantas gerações cristãs, que sentem a necessidade de elevar o seu coração, na certeza que estamos todos nas mãos cheias de misericórdia do Senhor.

«Te Deum laudamus!». Assim canta também a Igreja que está em Roma, pelas maravilhas que Deus realizou e realiza nela. Com a alma cheia de gratidão nos dispomos a atravessar o limiar do ano 2012, lembrando que o Senhor vela sobre nós e nos protege. Nesta tarde, queremos confiar-Lhe o mundo inteiro. Coloquemos em suas mãos as tragédias do nosso mundo e ofereçamos a Ele também as esperanças de um futuro melhor. Depositemos estes votos nas mãos de Maria, Mãe de Deus, Salus Populi Romani. Amém.


Fonte: Santa Sé.

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