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quarta-feira, 1 de março de 2023

Catequese do Papa Bento XVI: A oração (10)

Prosseguindo com suas Catequeses “de férias” sobre a oração, proferidas em Castel Gandolfo durante o mês de agosto de 2011, o Papa Bento XVI refletiu sobre a meditação.

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Papa Bento XVI
Audiência Geral
Quarta-feira, 17 de agosto de 2011
A oração (10): A meditação

Amados irmãos e irmãs,
Ainda estamos na luz da Solenidade da Assunção (15 de agosto), que - como eu disse - é uma festa da esperança. Maria chegou ao Paraíso e este é o nosso destino: todos podemos chegar ao Paraíso. A questão é: como? Maria conseguiu; ela - diz o Evangelho - é «aquela que acreditou que se haviam de cumprir as coisas que o Senhor lhe disse» (Lc 1,45). Portanto Maria acreditou, confiou em Deus, entrou com a sua vontade na vontade do Senhor e assim pôs-se precisamente na via diretíssima, no caminho rumo ao Paraíso. Crer, confiar no Senhor, entrar na sua vontade: este é o rumo essencial.

O Papa em oração no Santuário de Fátima (Portugal)

Hoje não gostaria de falar sobre todo este caminho da fé, mas só sobre um pequeno aspecto da vida de oração, que é a vida do contato com Deus, ou seja, sobre a meditação. E o que é meditação? Quer dizer «fazer memória» do que Deus fez e não esquecer os seus numerosos benefícios (cf. Sl 102,2b). Muitas vezes vemos só as coisas negativas; temos que conservar na nossa memória também as coisas positivas, os dons que Deus nos concedeu, prestar atenção aos sinais positivos que vêm de Deus e fazer memória deles. Portanto, falamos de um tipo de prece que na tradição cristã é chamada «oração mental». Em geral conhecemos a oração com palavras - naturalmente também a mente e o coração devem estar presentes nesta oração -, mas falemos hoje de uma meditação que não é feita de palavras, mas um contato da nossa mente com o Coração de Deus. E aqui Maria é um modelo muito real. O evangelista Lucas repete várias vezes que Maria «conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração» (Lc 2,19.51). Guardiã que não esquece, ela está atenta a tudo o que o Senhor lhe disse e fez, e medita, isto é, entra em contato com várias realidades, aprofundando-as no seu coração.

Portanto, aquela que «acreditou» no anúncio do anjo fez-se instrumento para que a Palavra eterna do Altíssimo pudesse encarnar-se, e acolheu também no seu coração o prodígio admirável daquele nascimento humano-divino, meditou-o, ponderou com a reflexão sobre o que Deus realizava nela, para acolher a vontade divina na sua vida e para lhe corresponder. O mistério da Encarnação do Filho de Deus e da maternidade de Maria é tão grande que exige um processo de interiorização; não é só algo de físico que Deus realiza nela, mas algo que requer uma interiorização da parte de Maria, que procura aprofundar a sua compreensão, interpretar o seu sentido e entender as suas influências e implicações. Assim, dia após dia, no silêncio da vida diária, Maria continuou a conservar no seu coração os sucessivos eventos admiráveis dos quais foi testemunha, até à prova extrema da Cruz e à alegria da Ressurreição. Maria viveu plenamente a sua existência, os seus deveres quotidianos, a sua missão de Mãe, mas soube manter em si um espaço interior para meditar sobre a Palavra e a vontade de Deus, sobre o que se realizava nela, sobre os mistérios da vida do seu Filho.

No nosso tempo vivemos absorvidos por numerosas atividades e compromissos, preocupações e problemas; muitas vezes tendemos a preencher todos os espaços do dia, sem ter um momento para parar, meditar e alimentar a vida espiritual, o contato com Deus. Maria ensina-nos como é necessário encontrar em nossos dias, com todas as atividades, momentos para nos recolhermos em silêncio e meditarmos sobre aquilo que o Senhor nos quer ensinar, sobre o modo como está presente e age no mundo e na nossa vida: sermos capazes de parar um momento e de meditar.

Santo Agostinho compara a meditação sobre os mistérios de Deus com a assimilação do alimento, e usa um verbo que se repete em toda a tradição cristã: «ruminar»; isto é, os mistérios de Deus devem ressoar continuamente em nós mesmos, para que se tornem familiares, orientem a nossa vida e nos nutram, como acontece com o alimento necessário para nos sustentarmos. E São Boaventura, referindo-se às palavras da Sagrada Escritura, diz que «devem ser sempre ruminadas para poderem ser fixadas com aplicação ardente do espírito» (Collationes in Hexaemeron, Quaracchi, 1934, p. 218).

Portanto, meditar quer dizer criar em nós uma situação de recolhimento, de silêncio interior para ponderar, assimilar os mistérios da nossa fé e de quanto Deus realiza em nós; e não só sobre as coisas que vêm e vão. Podemos fazer esta «ruminação» de vários modos, lendo por exemplo um breve trecho da Sagrada Escritura, sobretudo os Evangelhos, os Atos dos Apóstolos, as Cartas dos Apóstolos, ou então uma página de um autor de espiritualidade que nos aproxima e torna mais presentes as realidades de Deus no nosso hoje, talvez deixando-nos também aconselhar pelo confessor ou pelo diretor espiritual. Ler e meditar sobre o que lemos, “ruminando”, procurando compreender, entender o que me comunica, o que me diz hoje, abrir a nossa alma àquilo que o Senhor quer nos dizer e ensinar. Também o santo Rosário é uma prece de meditação: repetindo a “Ave Maria” somos convidados a repensar e meditar sobre o mistério que proclamamos. Mas podemos meditar inclusive sobre alguma experiência espiritual intensa, sobre palavras que nos ficaram gravadas mediante a participação na Eucaristia dominical. Então, vede, há muitos modos de meditar e assim de entrar em contato com Deus e de nos aproximarmos d’Ele e, desta forma, de estar a caminho do Paraíso.

Caros amigos, a constância ao reservar o próprio tempo a Deus é um elemento fundamental para o crescimento espiritual; é o próprio Senhor que nos infundirá o gosto pelos seus mistérios, suas palavras, sua presença e ação, sentindo como é bom quando Ele fala conosco; nos fará compreender de modo mais profundo o que deseja de nós. Afinal, é mesmo este o objetivo da meditação: entregar-nos cada vez mais nas mãos de Deus, com confiança e amor, certos de que só no cumprimento da sua vontade seremos enfim verdadeiramente felizes.

O Papa reza o rosário em Fátima (2010)

Fonte: Santa Sé.

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