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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Catequese do Papa Bento XVI: A oração (5)

Após os Patriarcas Abraão e Jacó, em sua 5ª Catequese sobre a oração o Papa Bento XVI refletiu sobre a intercessão de Moisés pelo povo no contexto da aliança do Sinai.

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Papa Bento XVI
Audiência Geral
Quarta-feira, 01 de junho de 2011
A oração (5):
A intercessão de Moisés pelo povo (Ex 32,7-14)

Queridos irmãos e irmãs,
Lendo o Antigo Testamento, uma figura ressalta no meio das outras: a de Moisés, precisamente como homem de oração. Moisés, o grande profeta e guia do tempo do êxodo, desempenhou a sua função de mediador entre Deus e Israel fazendo-se portador, junto do povo, das palavras e dos mandamentos divinos, conduzindo-o rumo à liberdade da Terra Prometida, ensinando os israelitas a viverem na obediência e na confiança em Deus, durante a sua longa permanência no deserto, mas também, e diria principalmente, rezando. Ele reza pelo Faraó quando Deus, com as pragas, procurava converter o coração dos egípcios (cf. Ex 8–10); pede ao Senhor a cura da irmã, Míriam, atingida pela lepra (Nm 12,9-13); intercede pelo povo que tinha se revoltado, amedrontado pela descrição dos exploradores (Nm 14,1-19); reza quando o fogo estava prestes a devorar o acampamento (Nm 11,1-2) e quando serpentes venenosas faziam matanças (Nm 21,4-9); dirige-se ao Senhor e reage, protestando quando o fardo da sua missão tinha se tornado demasiado pesado (Nm 11,10-15); vê Deus e fala com Ele «face a face, como alguém que fala com o próprio amigo» (cf. Ex 24,9-17; 33,7-23; 34,1-10.28-35).

Moisés desce do monte com as tábuas da Lei (Rembrandt)

Mesmo quando o povo, no Sinai, pede a Aarão que construa o bezerro de ouro, Moisés reza, explicando de maneira emblemática a própria função de intercessão. Este episódio é narrado no Livro do Êxodo (Ex 32) e contém uma narração paralela no Deuteronômio (Dt 9). É sobre este episódio que gostaria de meditar na catequese de hoje, de modo particular sobre a oração de Moisés, que encontramos na narração do Êxodo.

O povo de Israel encontrava-se aos pés do Sinai enquanto Moisés, no monte, esperava a entrega das tábuas da Lei, jejuando durante quarenta dias e quarenta noites (cf. Ex 24,18; Dt 9,9). O número quarenta tem um valor simbólico e significa a totalidade da experiência, enquanto com o jejum se indica que a vida vem de Deus, é Ele que a sustém. Com efeito, o gesto de comer implica a assunção do alimento que nos sustenta; por isso jejuar, renunciando ao alimento, adquire neste caso um significado religioso: é um modo para indicar que não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca do Senhor (Dt 8,3). Jejuando, Moisés demonstra que espera o dom da Lei divina como fonte de vida: ela revela a vontade de Deus e alimenta o coração do homem, fazendo-o entrar numa aliança com o Altíssimo, que é fonte da vida, é a própria Vida.

Mas enquanto o Senhor, no monte, oferece a Lei a Moisés, aos pés do mesmo monte o povo a transgride. Incapazes de resistir à expectativa e à ausência do mediador, os israelitas pedem a Aarão: «Faz-nos um deus que caminhe à nossa frente, porque a Moisés, que nos tirou do Egito, não sabemos o que lhe aconteceu» (Ex 32,1). Cansado de um caminho com um Deus invisível, agora que também Moisés, o mediador, desapareceu, o povo pede uma presença tangível, palpável, do Senhor, e encontra no bezerro de metal fundido, construído por Aarão, um deus que se torna acessível, manobrável, ao alcance do homem. Trata-se de uma tentação constante no caminho de fé: eludir o mistério divino, construindo um deus compreensível, correspondente aos próprios esquemas, aos próprios programas. Aquilo que acontece no monte Sinai demonstra toda a insensatez e vaidade ilusória desta pretensão porque, como afirma ironicamente o Salmo 105, «eles trocaram a sua glória pela estátua de um touro que come feno» (Sl 105,20).

Por este motivo, o Senhor reage e ordena a Moisés que desça do monte, revelando-lhe aquilo que o povo estava fazendo, e terminando com estas palavras: «Deixa, pois, que se acenda a minha cólera contra eles e os devore; mas de ti farei uma grande nação» (Ex 32,10). Como tinha acontecido com Abraão, a propósito de Sodoma e Gomorra, também agora Deus revela a Moisés o que pretende fazer, como se não quisesse agir sem o seu consenso (cf. Am 3,7). Ele diz: «Deixa, pois, que se acenda a minha cólera». Na realidade, este «deixa, pois, que se acenda a minha cólera» é pronunciado precisamente para que Moisés intervenha e lhe peça para não o fazer, revelando deste modo que o desejo de Deus é sempre a salvação. Como para as duas cidades dos tempos de Abraão, a punição e a destruição - nas quais se exprime a ira de Deus como rejeição do mal - indicam a gravidade do pecado cometido; ao mesmo tempo, o pedido do intercessor tenciona manifestar a vontade de perdão do Senhor. Esta é a salvação de Deus, que implica misericórdia, mas também denúncia da verdade do pecado, do mal que existe, de maneira que o pecador, reconhecendo e rejeitando o próprio mal, possa deixar-se perdoar e transformar por Deus. A prece de intercessão torna deste modo concreta, no contexto da realidade corrompida do homem pecador, a misericórdia divina, que encontra voz na súplica do orante e que se torna presente através dele onde há necessidade de salvação.

A súplica de Moisés está inteiramente centrada na fidelidade e na graça do Senhor. Ele refere-se em primeiro lugar à história de redenção à qual Deus deu início com a saída de Israel do Egito, para depois fazer memória da antiga promessa feita aos Pais. O Senhor realizou a salvação, libertando o seu povo da escravidão egípcia; por que então - questiona Moisés - «os egípcios diriam: “Fê-los sair com a malícia, para os deixar morrer nas montanhas, para os fazer desaparecer da face da terra”?» (Ex 32,12). A obra de salvação começada deve ser completada; se Deus fizesse perecer o seu povo, isto poderia ser interpretado como o sinal de uma incapacidade divina de completar o plano de salvação. Deus não pode permitir que isto aconteça: Ele é o Senhor bom que salva, o garante da vida, é o Deus de misericórdia e de perdão, de libertação do pecado que mata. E assim Moisés apela a Deus, à vida interior de Deus, contra a sentença exterior. Então - Moisés argumenta com o Senhor -, se os seus eleitos perecerem, mesmo que sejam culpados, Ele poderia parecer incapaz de derrotar o pecado. E isto não se pode aceitar. Moisés fez uma experiência concreta do Deus da salvação, foi enviado como mediador da libertação divina e agora, mediante a sua oração, torna-se intérprete de uma dupla inquietação, preocupado com o destino do seu povo, mas ao mesmo tempo também preocupado com a honra que é devida ao Senhor, pela verdade do seu Nome. Com efeito, o intercessor deseja que o povo de Israel seja salvo, porque é o rebanho que lhe foi confiado, mas também para que naquela salvação se manifeste a verdadeira realidade de Deus. Amor aos irmãos e amor a Deus compenetram-se na prece de intercessão: são inseparáveis. Moisés, o intercessor, é o homem contendido entre dois amores, que na oração se sobrepõem em um único desejo de bem.

Em seguida, Moisés apela à fidelidade de Deus, recordando-lhe as suas promessas: «Recorda-te de Abraão, de Isaac e de Israel, teus servos, aos quais juraste por ti mesmo e disseste: “Tornarei a tua posteridade tão numerosa como as estrelas do céu, e toda esta terra, da qual te falei, a darei aos teus descendentes, que a possuirão para sempre”» (Ex 32,13). Moisés faz memória da história fundadora das origens, dos Pais do povo e da sua eleição, totalmente gratuita, em que só Deus tivera a iniciativa. Eles não receberam a promessa por causa dos seus méritos, mas pela livre escolha de Deus e do seu amor (cf. Dt 10,15). E agora Moisés pede que o Senhor continue na fidelidade à sua história de eleição e de salvação, perdoando o seu povo. O intercessor não apresenta desculpas para o pecado do seu povo, não enumera méritos presumíveis, nem do povo nem seus, mas apela à gratuidade de Deus: um Deus livre, totalmente amor, que não cessa de procurar quem se afastou, que permanece sempre fiel a Si mesmo e oferece ao pecador a possibilidade de voltar para Ele e de se tornar, mediante o perdão, justo e capaz de fidelidade.

Moisés pede a Deus que se mostre até mais forte do que o pecado e a morte e, com a sua oração, suscita este revelar-se divino. Mediador de vida, o intercessor se solidariza com o povo; desejoso unicamente da salvação que o próprio Deus deseja, ele renuncia à perspectiva de se tornar um novo povo agradável ao Senhor. A frase que Deus lhe tinha dirigido, «de ti farei uma grande nação», nem sequer é tomada em consideração pelo «amigo» de Deus, que, ao contrário, está pronto a assumir sobre si mesmo não só a culpa do seu povo, mas todas as suas consequências. Quando, depois da destruição do bezerro de ouro, ele voltar ao monte para pedir de novo a salvação de Israel, dirá ao Senhor: «Rogo-te que lhes perdoes agora este pecado! Senão, apaga-me do livro que escreveste» (Ex 32,32). Com a oração, desejando a vontade de Deus, o intercessor entra cada vez mais profundamente no conhecimento do Senhor e da sua misericórdia, tornando-se capaz de um amor que chega até ao dom total de si mesmo.

Em Moisés, que está no alto do monte, face a face com Deus, e que se faz intercessor para o seu povo e oferece a si mesmo - «apaga-me» - os Padres da Igreja viram uma prefiguração de Cristo que, no alto da cruz, realmente está diante de Deus, não apenas como amigo, mas como Filho. E não só se oferece - «apaga-me» - mas com o seu coração transpassado faz-se cancelar, torna-se - como diz o próprio São Paulo - pecado, carrega sobre si os nossos pecados para nos salvar a todos; a sua intercessão é não só solidariedade, mas identificação conosco: traz todos nós no seu corpo. E assim toda a sua existência de homem e de Filho é um clamor ao Coração de Deus, é perdão, mas perdão que transforma e renova.

Penso que devemos meditar sobre estas realidades. Cristo está diante do Rosto de Deus e reza por mim. A sua oração na Cruz é contemporânea a todos os homens, contemporânea a mim: Ele reza por mim, sofreu e sofre por mim, identificou-se comigo, assumindo o nosso corpo e a nossa alma humana. E convida-nos a entrar nesta sua identidade, fazendo-nos um corpo, um só espírito com Ele, porque do alto da Cruz Ele não trouxe novas leis, tábuas de pedra, mas trouxe a si mesmo, o seu Corpo e o seu Sangue, como nova aliança. É assim que nos faz consanguíneos com Ele, um Corpo com Ele, identificados com Ele. Convida-nos a entrar nesta identificação, a estar unidos com Ele no nosso desejo de ser um corpo, um só espírito com Ele. Oremos ao Senhor, para que esta identificação nos transforme, nos renove, porque o perdão é renovação, é transformação.

Gostaria de concluir esta catequese com as palavras do Apóstolo Paulo aos cristãos de Roma: «Quem poderia acusar os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? Cristo Jesus, que morreu, ou melhor, que ressuscitou, que está à direita de Deus, é quem intercede por nós! Quem nos separará do amor de Cristo? (...) Nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados (...) nem qualquer outra criatura poderá nos separar do amor que Deus nos testemunha em nosso Senhor Jesus Cristo» (Rm 8,33-35.38.39).

A oração de Moisés (Ivan Kramskoy)

Fonte: Santa Sé.

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