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quarta-feira, 9 de março de 2022

Dom Henrique Soares da Costa: Paixão segundo Lucas 1-2

“Desejei ardentemente comer convosco esta ceia pascal” (Lc 22,15).

Dom Henrique Soares da Costa
Quaresma 2019
A Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo segundo Lucas

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Paixão segundo Lucas I: Lc 22,14-18

Quando chegou a hora, Jesus pôs-Se à mesa com os apóstolos e disse: “Desejei ardentemente comer convosco esta ceia pascal, antes de sofrer. Pois Eu vos digo que nunca mais a comerei, até que ela se cumpra no Reino de Deus”. Então Jesus tomou um cálice, deu graças e disse: “Tomai este cálice e reparti entre vós; pois Eu vos digo que, de agora em diante, não mais beberei do fruto da videira, até que venha o Reino de Deus” (Lc 22,14-18).

Palavras tremendas, estas de Jesus, na Paixão que escutamos neste Domingo de Ramos...

Desejei ardentemente comer convosco esta ceia pascal!” Cada um de nós deveria escutar, de modo grato, comovido, esta revelação tão doce do Coração do nosso Salvador! Estas palavras, ditas naquele Cenáculo de Jerusalém, ecoam de geração em geração de cristãos e, chegam hoje aos nossos ouvidos - quem dera chegassem também ao nosso coração: ardentemente, o Salvador deseja comer Sua Páscoa deste ano conosco; Sua única e eterna Páscoa, tornada verdadeiramente presente e atuante em cada Celebração pascal! Este não é tempo de viagens, de passeios, de casas de praia ou de campo; este é tempo de comer com o Senhor e com os irmãos reunidos em Igreja a Sua Ceia pascal!

Última Ceia - Duccio di Buoninsegna

Jesus sabia que iria morrer, sabia do sacrifício tremendo, do drama horrendo que O esperava e O colocava todo presente nesta Ceia, Ceia comida “antes de sofrer”. Esta Ceia é a Ceia do Seu Sacrifício, a Ceia bendita na qual a Igreja celebrará, até que Seu Esposo volte, o Banquete do Seu Sacrifício pascal! E aí vem a revelação misteriosa, profunda, forte: “Nunca mais a comerei, até que ela se realize no Reino de Deus!” É a última refeição pascal do Senhor Jesus neste mundo.

A ceia judaica, celebrada a cada ano por Israel, tinha um sentido profundo: tornava presente a libertação da escravidão do Egito, quando Deus fez de um bando de perdidos um Povo, o Seu Povo. Comendo a Páscoa, os judeus não somente entravam nesta salvação de Deus, mas experimentavam já, naqueles ritos solenes, a salvação definitiva e completa que ocorreria quando o Messias viesse. O cordeiro macho e sem defeito, sem nenhum de seus ossos quebrado; as ervas amargas das amarguras da vida; o molho avermelhado, como os tijolos do Egito; o pão da miséria, pão ázimo, sinal das misérias e precariedades de nossa vida: tudo profecia, tudo preparação, tudo saudade do Messias bendito que deveria vir...

E agora Ele veio: Sua Páscoa, saída deste mundo em dores de Cruz, passagem pelo Mar Vermelho da tremenda Morte e saída do outro lado, lado da Vida, lado do Pai, Deus de Israel - tudo isto estaria presente naquela Ceia derradeira, nos ritos judaicos que o Senhor agora faria Seus ritos, ritos de Sua Páscoa e da Páscoa de Sua Igreja, princípio de toda Liturgia cristã... “Nunca mais comerei desta Ceia! Ela é princípio e presença do Reino que Eu trouxe. Um dia, no Meu Dia, na Glória, Eu a comerei eternamente convosco, Meus discípulos, no Banquete sem fim do Céu, no qual Eu mesmo serei vosso alimento!”

E Jesus, seguindo o rito pascal judaico, tomou o primeiro dos quatro cálices, o Cálice da Aceitação. Sim, Jesus aceita o desígnio do Pai a Seu respeito, como o Pai aceitará o sacrifício do Filho por nós! “Não mais beberei deste cálice até que venha o Reino de Deus!” Sim, o Reino virá nas dores da Cruz e se manifestará de modo pleno no Dia sem fim da Minha Glória!

É isto, caro Irmão meu! Esta Ceia bendita na verdade é já um Sacrifício, ou melhor, o Sacrifício único e perfeito do Salvador nosso! Aquilo que Ele realizaria na Cruz dando-nos o Reino, antecipou ritualmente, tornou verdadeiramente presente de modo litúrgico naquela Ceia!

Ceia de despedida, de saudade, de Amor que se entrega totalmente, sem nada reservar para Si. Santa Teresinha dizia que “amar é tudo dar e dar-se a si mesmo”. Nesta Ceia, Ceia da Eucaristia de cada Domingo, Jesus Se nos deu assim!

Nós Vos adoramos, Santíssimo Senhor Jesus Cristo, e Vos bendizemos, porque pela Vossa santa Cruz remistes o mundo!

Paixão segundo Lucas II: Lc 22,19-20

A seguir, Jesus tomou um pão, deu graças, partiu-o e deu-o aos discípulos, dizendo: “Isto é o Meu corpo, que é dado por vós. Fazei isto em memória de Mim”. Depois da ceia, Jesus fez o mesmo com o cálice, dizendo: “Este cálice é a nova Aliança no Meu sangue, que é derramado por vós” (Lc 22,19-20).

Aquilo que o Senhor iria realizar dolorosamente na Sexta-feira, Ele o realizou ritualmente na Quinta. Basta recordar o Êxodo: Deus ia fazer Israel atravessar o Mar Vermelho (na Escritura o mar tem sempre a ver com o caos, a morte); ordenou-lhe que antes celebrasse ritualmente essa passagem na ceia pascal judaica como memorial perpétuo. O mesmo fez Jesus: na Sexta, entraria no terrível Mar da Morte - morte tremenda, morte de pecado; Ele, que não cometeu pecado. Entrando neste Mar, Ele abriria um caminho até o outro lado, até o Pai, Deus vivo e vivificante! Seus discípulos, novo Israel, Sua Igreja, poderia passar por esta passagem que Ele iria abrir... Mas, antes, o Senhor quis entregar para sempre Sua Passagem, Seu Sacrifício de Morte e Ressurreição à Sua Igreja. Por isto, na Páscoa judaica, Ele instituiu a Sua Páscoa que, celebrada, se tornaria Páscoa da Igreja, nossa Páscoa.

Agora, o pão ázimo (pão da miséria) da Páscoa judaica se tornaria Corpo do Senhor, Corpo quebrado, oferecido na Cruz como imolação.

Isto é o Meu Corpo dado por vós”. Corpo, aqui, não é a simples musculatura. Corpo significa, neste contexto, a humanidade de alguém. “O que Eu recebi no ventre da Virgem, toda a Minha natureza humana, com Meus sonhos, Meu amor, Minha alma e Meu corpo, tudo Eu entrego sacrificalmente em vosso favor!”. Em outras palavras: “Eu vos entrego toda a Minha existência, Eu Me entrego à morte totalmente por vós!”.

Este cálice é a nova Aliança no Meu Sangue, que é derramado por vós!” Sangue, na Escritura, significa a vida. O sangue derramado é a vida entregue, esparramada. Pois bem: “Eu vos dou a Minha morte, derramo na Cruz, por vossa causa, para vossa salvação, a vida que derramei a vida toda! Fui Me derramando desde que Me fiz homem: derramei-Me no ventre da Virgem, derramei-Me na pobreza de Belém, na fuga para o Egito, nos anos silenciosos de Nazaré... Derramei-Me, cansado, nas estradas da Palestina, derramei-Me pregando, curando, nas noites em oração... Agora completo a entrega, o derramamento de Minha vida! É por vós! Sangue da nova Aliança. Não mais o sangue do cordeiro lá no Êxodo, mas o Meu Sangue, Cordeiro que o Pai entrega agora por vós e pela multidão para a remissão dos pecados!”.

E o Senhor ordenou à Sua Igreja que celebrasse este Sacrifício ritual, este Sacrifício em forma de ceia até que Ele volte. E cada vez que a Igreja celebrasse o santíssimo Sacrifício do Salvador, oferecido uma vez por todas, cada geração de cristãos entraria no Sacrifício do Senhor e o Sacrifício do Senhor entraria na vida do discípulo... E aí, as dores do Senhor se tornariam nossas e nossas dores se tornariam as d’Ele!

Eis o Sacrifício da nova e eterna Aliança! Eis a fonte da Vida e santidade da Igreja! Eis o verdadeiro Cordeiro imolado como nosso perdão e nossa oferta: o Cristo no altar, o Cristo na cruz!

Obrigado, Senhor Jesus, por tão grande dom!

Dom Henrique venera a Cruz

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