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quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Jubileu das Pessoas com Deficiência no ano 2000

No dia 03 de dezembro do ano 2000 o Papa João Paulo II celebrou a Santa Missa na Basílica de São Paulo fora dos muros por ocasião do Jubileu das Pessoas com Deficiência no contexto do Ano Santo.

Foi celebrada a Missa do I Domingo do Advento (ano C).

Jubileu das Pessoas com Deficiência
Homilia do Papa João Paulo II
03 de dezembro de 2000

1. Levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima (Lc 21,28).
São Lucas, no texto evangélico oferecido à nossa meditação neste I Domingo do Advento, sublinha o receio que atemoriza os homens perante as perturbações finais. Mas, por contraste, o evangelista apresenta com relevo muito maior a perspectiva jubilosa da expectativa cristã: “Então - diz - verão o Filho do Homem vir sobre uma nuvem, com grande poder e glória” (Lc 21,27). Eis o anúncio que dá esperança ao coração do crente: o Senhor virá “com grande poder e glória”. Por isso os discípulos são convidados a não terem receio, mas a levantar-se e a erguer a cabeça, “porque a vossa libertação está próxima” (Lc 21,28).
A Liturgia faz-nos ouvir todos os anos, no início do Advento, esta “boa nova”, que ecoa com extraordinária eloquência na Igreja. É a boa nova da nossa salvação: é o anúncio de que o Senhor está próximo. Ou melhor, que Ele já está conosco.


2. Caríssimos irmãos e irmãs! Sinto vibrar no espírito este convite à serenidade e à esperança sobretudo hoje, ao celebrar juntamente convosco o Jubileu das pessoas deficientes.
Celebramo-lo no dia que vos é dedicado pelas Nações Unidas, que há precisamente 25 anos publicaram a “Declaração sobre os Direitos das pessoas deficientes”.
Saúdo-vos com afeto, queridos amigos, que sofreis de uma ou de mais formas de deficiência, e que desejastes vir a Roma para este encontro de fé e de fraternidade. Agradeço aos vossos representantes e ao Diretor da Caritas Italiana as palavras que me dirigiram no início da Santa Missa. Faço extensivo o meu cordial pensamento a todos os portadores de deficiência, aos seus familiares e aos voluntários, que neste mesmo dia celebram o seu Jubileu com os seus Pastores, nas várias Igrejas locais.

Caríssimos irmãos e irmãs, no vosso corpo e na vossa vida, sois portadores de uma intensa esperança de libertação. Não encerra porventura isso uma intrínseca expectativa da “libertação” que Cristo nos obteve com a sua Morte e Ressurreição? Com efeito, cada pessoa marcada por uma dificuldade física ou psíquica vive uma espécie de “advento” existencial, a expectativa de uma “libertação” que se manifestará plenamente, tanto para ela como para todos, unicamente no final dos tempos. Sem a fé, esta expectativa pode assumir os tons da desilusão e do desconforto; amparada pela Palavra de Cristo, ela transforma-se em esperança viva e laboriosa.

3. “Ficai atentos e rezai continuamente, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes de pé diante do Filho do Homem” (Lc 21,36). A Liturgia de hoje fala-nos da segunda vinda do Senhor; ou seja, fala da vinda gloriosa de Cristo que coincidirá com aquilo que, em palavras simples, se chama “o fim do mundo”. Trata-se de um acontecimento misterioso que, na linguagem apocalíptica, apresenta sobretudo o aspecto de um imenso cataclismo. Assim como o fim do indivíduo, isto é, a morte, também o fim do universo suscita a angústia perante o que é desconhecido, o medo do sofrimento, juntamente com perguntas repletas de trepidação acerca do “além-mundo”.
O tempo do Advento, que precisamente hoje tem início, estimula a prepararmo-nos para acolher o Senhor que há de vir. Como nos devemos preparar? A significativa celebração que estamos a fazer ressalta que uma forma concreta de nos dispormos para aquele encontro é a proximidade e a partilha com quem, por qualquer motivo, se encontra em dificuldade. Ao reconhecer Cristo no irmão, predispomo-nos para sermos reconhecidos por Ele quando vier definitivamente. É assim que a comunidade cristã se prepara para a segunda vinda do Senhor: dando prioridade a todos os que o próprio Jesus privilegiou, àquelas pessoas que muitas vezes a sociedade marginaliza e não considera.

4. Foi o que fizemos hoje, reunindo-nos nesta Basílica para viver a graça e a alegria do Jubileu juntamente convosco, que vos encontrais em condições de deficiência, e com as vossas famílias. Desejamos, com este gesto, fazer nossos os vossos anseios e expectativas, os vossos dons e problemas.
Em nome de Cristo, a Igreja empenha-se em tornar-se para vós, cada vez mais, uma “casa acolhedora”. Sabemos que o deficiente - pessoa única e irrepetível na sua igual e inviolável dignidade - requer não só curas, mas antes de mais um amor que se torne reconhecimento, respeito e integração: do nascimento à adolescência, até a idade adulta e ao momento delicado, vivido com trepidação por tantos pais, da separação dos próprios filhos, o momento do “depois de nós”. Caríssimos, desejamos sentir-nos partícipes das vossas fadigas e dos inevitáveis momentos de desânimo, para iluminá-los com a luz da fé e com a esperança da solidariedade e do amor.

5. Com a vossa presença, caríssimos irmãos e irmãs, reconfirmais que a deficiência não é apenas necessidade, é também e sobretudo estímulo e solicitação. Sem dúvida, ela é pedido de ajuda, mas, ainda antes, é provocação em relação aos egoísmos individuais e coletivos; é convite a formas sempre novas de fraternidade. Com a vossa realidade, pondes em crise as concepções da vida ligadas unicamente à satisfação, ao parecer, à pressa e à eficiência.
Também a comunidade eclesial se coloca em respeitosa escuta; ela sente a necessidade de se deixar interrogar pelo cansaço de muitas das vossas existências marcadas misteriosamente pelo sofrimento e pelas dificuldades devido a acontecimento lesivos, congênitos ou adquiridos. Deseja tornar-se mais próxima de vós e das vossas famílias, consciente de que a falta de atenção provoca sofrimento e solidão, enquanto a fé testemunhada no amor e na gratuidade dá força e sentido à vida.
A todos os que têm responsabilidades políticas a qualquer nível, desejaria pedir, nesta solene circunstância, que se empenhem a fim de que sejam garantidas condições de vida e oportunidades que consintam que a vossa dignidade, queridos irmãos e irmãs, seja efetivamente reconhecida e tutelada. Numa sociedade rica de conhecimentos científicos e técnicos, é possível e também é um dever fazer mais, dos vários modos que a convivência civil requer: desde a pesquisa biomédica para prevenir a deficiência, até à cura, à assistência, à reabilitação e à nova integração social.
Se os vossos direitos civis, sociais e espirituais devem ser tutelados, é ainda mais importante salvaguardar as relações humanas: relações de ajuda, de amizade e de partilha. Eis o motivo pelo qual devem ser promovidas formas de cura e de reabilitação que tenham em conta a visão integral da pessoa humana.

6. “Que o Senhor vos faça crescer e aumentar no amor mútuo” (1Ts 3,12).
São Paulo indica-nos hoje o caminho da caridade como via-mestra para ir ao encontro do Senhor que há de vir. Ele ressalta que só amando de maneira sincera e desinteressada poderemos estar preparados “por ocasião da vinda de nosso Senhor Jesus com todos os Seus santos” (1Ts 3,13). Mais uma vez o amor é o critério decisivo, hoje e sempre.
Na cruz, ao oferecer-Se a Si mesmo em resgate por nós, Jesus realizou o juízo da salvação, revelando o desígnio de misericórdia do Pai. Ele antecipa este juízo ao presente: identificando-se com “o mais pequenino dos irmãos”, Jesus pede-nos que o acolhamos e sirvamos com amor. No último dia nos dirá: tive fome, e Me destes de comer... (cf. Mt 25,35), e nos perguntará se anunciamos, vivemos e testemunhamos o Evangelho da caridade e da vida.

7. Como são eloquentes para nós hoje estas Vossas palavras, Senhor da vida e da esperança! Em Vós qualquer limite humano é resgatado e redimido. Graças a Vós, a deficiência não é a última palavra da vida. É o amor a última palavra, é o Vosso amor que dá sentido à vida.
Ajudai-nos a orientar o coração para Vós; ajudai-nos a reconhecer o Vosso rosto que resplandece em cada criatura humana por muito que seja provada pela fadiga, pelas dificuldades e pelo sofrimento.
Fazei com que compreendamos que “a glória de Deus é o homem vivo” (Irineu de Lião, Adversus haereses, 4, 20, 7), e fazei com que um dia possamos pregustar, na visão divina, juntamente com Maria, Mãe da humanidade, a plenitude da vida por Vós redimida. Amém!


Fonte: Santa Sé.

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