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segunda-feira, 27 de maio de 2019

Homilia do Papa: Missa na Assembleia da Cáritas

Santa Missa para a Abertura da XXI Assembleia Geral da Caritas Internationalis
Homilia do Papa Francisco
Basílica Vaticana, Altar da Cátedra
Quinta-feira, 23 de maio de 2019

A Palavra de Deus, na leitura de hoje dos Atos dos Apóstolos, conta o primeiro grande encontro da história da Igreja. Uma situação inesperada ocorreu: os pagãos chegaram à fé. E surge uma pergunta: eles têm que se adaptar, como os outros, a todas as normas da lei antiga? Foi uma decisão difícil de tomar e o Senhor não estava mais presente. Alguém poderia perguntar: por que Jesus não deixou uma sugestão para resolver pelo menos esse primeiro “grande debate” (At 15,7)? Uma pequena indicação teria sido suficiente para os Apóstolos, que durante anos estiveram com ele todos os dias. Por que Jesus nem sempre dera regras claras e rápidas de resolução?
Aqui está a tentação da eficiência, pensar que a Igreja está bem se tiver tudo sob controle, se viver sem choques, com a agenda sempre em ordem, tudo regulado… É também a tentação da casuística. Mas o Senhor não prossegue assim; de fato, para seus seguidores, ele não envia uma resposta, ele envia o Espírito Santo. E o Espírito não vem trazendo a agenda, vem como fogo. Jesus não quer que a Igreja seja um modelo perfeito, que acolha sua própria organização e seja capaz de defender seu bom nome. Pobres aquelas Igrejas particulares que estão tão ocupadas na organização, nos planos, tentando ter tudo claro, tudo distribuído. Isso me faz sofrer. Jesus não viveu assim, mas no caminho, sem temer os choques da vida. O Evangelho é o nosso programa de vida, tudo está lá. (At 9,2) para viajar juntos, sempre juntos, com um espírito de confiança. A partir do relato dos Atos, aprendemos três elementos essenciais para a Igreja a caminho: a humildade da escuta, o carisma do todo, a coragem da renúncia.
Vamos começar com o fim: a coragem da renúncia. O resultado dessa grande discussão não foi impor algo novo, mas deixar algo velho. Mas aqueles primeiros cristãos não abandonaram nada do nada: eram importantes tradições e preceitos religiosos, caros ao povo escolhido. A identidade religiosa estava em jogo. No entanto, eles escolheram que o anúncio do Senhor vem em primeiro lugar e vale mais do que tudo. Para o bem da missão, anunciar a alguém, de forma transparente e crível, que Deus é amor, até mesmo aquelas crenças e tradições humanas que são mais um obstáculo do que uma ajuda, podem e devem ser deixadas. A coragem de sair. Nós também precisamos redescobrir juntos a beleza da renúncia acima de tudo para nós mesmos. São Pedro diz que o Senhor “purificou os corações com fé” (cf. At 15,9). Deus purifica, Deus simplifica, muitas vezes nos faz crescer removendo, não acrescentando, como faríamos. A fé verdadeira purifica dos apegos. Para seguir o Senhor, é preciso andar rápido e andar depressa, deve-se aliviar, mesmo que isso custe. Como Igreja, não somos chamados a comprometer negócios, mas a explosões evangélicas. E, ao nos purificarmos, ao nos reformarmos, devemos evitar o leopardismo, isto é, fingir que mudamos alguma coisa, de modo que, na realidade, nada muda. Isso acontece, por exemplo, quando, para tentar acompanhar os tempos, a superfície das coisas é colocada um pouco, mas é apenas maquiagem para parecer jovem. O Senhor não quer ajustes cosméticos, ele quer a conversão do coração, que passa pela renúncia. Sair de si mesmo é a reforma fundamental.
Vamos ver como os primeiros cristãos chegaram lá. Eles chegaram à coragem da renúncia a partir da humildade de ouvir. Eles praticavam abnegação: vemos que cada um deixa o outro falar e está disposto a mudar suas crenças. Ele sabe escutar apenas aqueles que deixam a voz da outra pessoa realmente entrar nele. E quando o interesse pelos outros cresce, o altruísmo aumenta. Tornamo-nos humildes seguindo o caminho da escuta, que nos impede de nos afirmarmos, de buscar resolutamente nossas próprias ideias, de buscar consenso com todos os meios. A humildade nasce quando, em vez de falar, ouvimos; quando você deixa de estar no centro. Então cresce através de humilhações. É o caminho do serviço humilde, aquele que Jesus viajou, é neste caminho de caridade que o Espírito desce e dirige.
Para aqueles que querem seguir os caminhos da caridade, a humildade e a escuta significam que o ouvido é voltado para os pequenos. Vamos olhar novamente para os primeiros cristãos: todos ficam em silêncio para ouvir Barnabé e Paulo. Eles foram os últimos a chegar, mas deixaram que relatassem tudo o que Deus havia feito através deles (cf. v. 12). É sempre importante ouvir a voz de todos, especialmente os pequenos e os últimos. No mundo quem tem mais meios fala mais, mas entre nós não pode ser assim, porque Deus ama se revelar através do pequeno e do último. E todo mundo pede para não olhar para ninguém de cima para baixo. É permitido olhar para uma pessoa de cima para baixo apenas para ajudá-la a se levantar; a única vez, senão você não pode.
E, finalmente, ouvindo a vida: Paulo e Barnabé falam sobre experiências, não ideias. A Igreja faz tal discernimento; não na frente do computador, mas na frente da realidade das pessoas. As ideias são discutidas, mas as situações são discernidas. Pessoas diante dos programas, com o olhar humilde de quem sabe buscar nos outros a presença de Deus, que não vive na grandeza daquilo que fazemos, mas na pequenez dos pobres que encontramos. Se não olharmos diretamente para eles, acabamos sempre olhando para nós mesmos; e para torná-los instrumentos de nossa afirmação, usamos os outros.
Da humildade de ouvir a coragem da renúncia, tudo passa pelo carisma do todo. De fato, na discussão da primeira Igreja, a unidade sempre prevalece sobre as diferenças. Para cada pessoa, em primeiro lugar, não há suas próprias preferências e estratégias, mas sim ser e sentir a Igreja de Jesus, reunida em torno de Pedro, na caridade que não cria uniformidade, mas comunhão. Ninguém sabia de tudo, ninguém tinha todos os carismas, mas cada um se apegou ao carisma do todo. É essencial, porque você não pode realmente fazer o bem sem realmente se importar. Qual foi o segredo daqueles cristãos? Eles tinham sensibilidades e orientações diferentes, também havia personalidades fortes, mas havia a força de amar uns aos outros no Senhor. Nós o vemos em Tiago, que, na hora de tirar conclusões, diz algumas palavras dele e cita grande parte da Palavra de Deus (cf. vv. 16-18). Deixe a palavra falar. Enquanto as vozes do diabo e do mundo levam à divisão, a voz do Bom Pastor forma um só rebanho. E assim a comunidade é baseada na Palavra de Deus e permanece em seu amor.
“Permanece no meu amor” (Jo 15,9): é o que Jesus pede no Evangelho. E como isso é feito? Devemos ficar perto dele, pão partido. Ajuda-nos a estar diante do tabernáculo e diante dos muitos tabernáculos vivos que são os pobres. A Eucaristia e os pobres, um tabernáculo fixo e tabernáculos móveis: ali permanece um amor e absorve a mentalidade do pão partido. Ali se entende o “como” de que Jesus fala: “Como o Pai me amou, eu também te amei” (ibid.). E como o Pai amava a Jesus? Dando tudo, não retendo nada para si. Dizemos isso no Credo: “Deus de Deus, luz da luz”; deu-lhe tudo. Quando, em vez disso, nos retivermos da doação, quando, em primeiro lugar, há os nossos interesses a defender, não agimos semelhante a Deus, não somos uma Igreja livre e libertadora. Jesus pede para permanecer Nele, não em nossas ideias; sair da pretensão de controlar e administrar; ele nos pede para confiar nos outros e nos entregar aos outros. Pedimos ao Senhor que nos liberte da eficiência, do mundanismo, da tentação sutil de adorar a nós mesmos e às nossas habilidades, da organização obsessiva. Pedimos a graça de aceitar o caminho indicado pela Palavra de Deus: humildade, comunhão, renúncia.


Fonte: Cáritas.org

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