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quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Missa da Noite de Natal em Belém: Homilia

“Jesus vem habitar a nossa cidade”

Senhor Presidente,
Caros representantes das autoridades,
Veneráveis Irmão no episcopado e no sacerdócio,
Caros irmãos e irmãs, caros fiéis da nossa diocese de Jerusalém, caros peregrinos vindos do mundo inteiro e todos vós que, no coração da noite, estais conosco através dos diferentes meios de comunicação: acorremos todos aqui porque nos sentimos todos convocados por este lugar, Belém, a cidade na qual nasceu o nosso Salvador que é Cristo Nosso Senhor!
“Jesus nasceu em Belém” (Mt 2,1). Não é apenas uma indicação histórica e geográfica, mas uma escolha divina. Nascer aqui, neste preciso lugar, numa cidade desta terra é o que Deus sempre quis porque Ele gosta das cidades dos homens. Se a Bíblia começa num jardim, em contrapartida termina numa cidade, Jerusalém Celeste. E mesmo a vida de Cristo que começa aqui será, desde o seu nascimento até à sua morte, um constante caminhar entre cidades e aldeias. O deserto não foi para Ele mais do que um parênteses necessário, mas não definitivo.
Belém, Nazaré, Caná, Cafarnaum, Jerusalém: nomes que nos são queridos uma vez que foram cidades amadas por Jesus. Depois dele, os Apóstolos continuarem a percorrer tantas outras: Corinto, Éfeso, Tessalônica, Antioquia, Roma…é um caminho que continua pelas nossas cidades de hoje. É um caminho mantido e animado pela sua presença. “E eu estarei convosco todos os dias até ao fim do mundo” (Mt 28,20)
O nosso Deus é um Deus da cidade. Ele habita as cidades porque Ele é um Deus que está junto dos homens, Emanuel. A sua palavra não se esgota numa proposta religiosa privada ou unicamente pessoal. Pelo contrário, ela procura e deseja uma estrada, uma casa, uma cidade para habitar e transformar. Aquele que quer fechar o Evangelho ou a presença dos cristãos no interior de fronteiras privadas ou num contexto intimista não compreendeu o desejo de Deus. A Encarnação do Filho de Deus é uma levedura, um fermento destinado a aumentar toda a massa, ou seja, toda a realidade do homem, cosmos e história, vida e cidade.
O Natal de Jesus Cristo em Belém é um passo de Deus em direção da nossa terra e das nossas cidades. É um convite feito aos pastores e aos magos que se repete hoje e nos convida a que nos dirijamos a Belém e, a partir de lá, até aos confins da terra. O nascimento do Senhor nas nossas cidades pretende fazer nascer em nós uma forma de “paixão política”, suscitar a responsabilidade do cuidado da cidade e da terra em que habitamos. Não se trata de a dominar ou ocupar, mas de a transformar.  É preciso transformá-lo de um simples aglomerado urbano ao serviço de um só, num espaço e um lugar onde a experiência de comunhão e de paz, de relação e de partilha seja possível.
Permiti-me hoje, a partir deste mesmo lugar, dirigir um olhar preocupado e atento às nossas cidades e ao nosso o mundo para verdadeiramente os habitarmos. Na luz do Verbo de Deus, que vem habitar entre nós, gostaria de me deter com todos vós e contemplar esta “morada de Deus” para a acolher e converte-la na “morada do homem”.
Cristo morar entre nós foi, antes de mais, um ato de amor. Ele partilhou a nossa vida em tudo exceto no pecado (cf. Hb 4,15). Por onde Ele passava fazia o bem e curava” (At 10,38) Entrou nas nossas casas, comeu à nossa mesa, bebeu o nosso vinho, caminhou ao longo das nossas estradas, brincou com as nossas crianças, alegrou-se com as nossas festas e chorou pelos nossos mortos. Ele não escolheu a separação e a distância, ele não gostou do isolamento e do afastamento. Ele escolheu o estilo da partilha e da comunhão, da participação e da presença. Os seus discípulos – nós os cristãos – não podemos deixar de seguir os seus traços. Se é verdade que não temos uma cidade definitiva aqui em baixo, mas que nos encaminhamos para a cidade futura (cf. Hb 13,14), é também verdade que nos foi pedido que “continuássemos na cidade” (cf. Lc 24,49) para nela abrir os caminhos do Reino.
Nesta noite, em que celebramos o nascimento de Cristo em Belém, proclamamos com os anjos, o amor por esta terra, por estas cidades; queremos responder à vocação recebida de sermos aqui os artesãos da paz, os profetas da esperança, as testemunhas convencidas e convincentes da partilha e do diálogo.
Queremos, com Jesus, habitar esta terra, não a abandonar para partilharmos as suas dores e angústias, as alegrias e as esperanças e juntos percorrermos o caminho da salvação. Estamos dispostos a qualquer esforço, a qualquer compromisso e a qualquer iniciativa que que possam tornar as nossas cidades abertas e hospitaleiras, lugares em que se possa encontrar uma casa e um trabalho, uma vida digna e boa. Pedimos ao menino de Belém e aos seus pais, que vieram aqui à procura de um alojamento, que dos ajudem a continuarmos nesta cidade. Pedimos ajuda para continuarmos a ser, como eles, presença de paz nesta terra. Porque as nossas cidades ficariam mais pobres sem cristãos, e os cristãos arriscariam a perder-se sem as nossas cidades.
Reconhecemos que, nesta cidade, a Sagrada Família ouviu recusas, viu portas fechadas e a violência cega de Herodes. É sempre possível que os seus não reconheçam o Salvador que chega e não o acolham (cf. 1,11). Vindo morar entre nós, o Senhor revela igualmente a contradição (cf. Lc 2,34) na sua forma, muitas vezes conflituosa, de habitar nestes lugares. A cidade bem-amada é também a que o faz chorar (cf. 19,41), quando os caminhos triunfais se tornam rapidamente numa via sacra, numa estrada de dor. As cidades dos homens podem rapidamente transformar-se em campos de batalha, em lugares de confronto e opressão, de injustiça e de violência. Então a voz do Senhor e, ainda mais, a sua vida pedem e oferecem hoje uma possibilidade de transformação que não passa pela via do protesto estéril ou da oposição violenta, mas propõe-nos e dá-nos testemunho da via do serviço humilde e concreto. Quereríamos então que nas nossas praças e nas nossas casas pela nossa palavra e pelo nosso testemunho, o Evangelho possa continuar a transformar a nossa maneira de vivermos juntos, as nossas relações e as nossas escolhas. Pedimos que a sua palavra e a nossa oração encontrem corações que escutem, principalmente os daqueles que detêm autoridade política e social. Queríamos não ter de chorar mais pela recusa, pela pobreza extrema e pelos inúmeros sofrimentos que afligem o nosso povo. Gostaríamos que, graças à boa vontade de todos, Deus possa continuar a habitar nas nossas cidades.
Assim esperamos que as nossas cidades sejam verdadeiramente santas, não somente e não tanto em razão das preciosas memórias guardadas nas sua pedras, mas muito mais pela vida que aí se encontra. O Senhor, ao nascer entre nós, trouxe à terra o começo do seu Reino. E ele prometeu o seu cumprimento em Jerusalém celeste. A nossa celebração do Natal não é uma simples comemoração, mas o anúncio que o que germinou com o nascimento de Cristo terá o seu pleno cumprimento quando Ele voltar.
Enquanto esperamos a sua vinda, construímos as nossas cidades. Seria infinitamente melhor se elas não fossem a expressão do poder ou de reivindicações como o foi Babel, mas sim casas de oração e de encontro para todos os povos (Is 56,7). Queremos então zelar com os nossos pastores para que a promessa de Salvação chegue até nós e guie os nossos passos nos caminhos do bem. Como os Magos, queremos olhar para a Estrela de Belém e acolher a graça e o humilde amor do nosso Deus para voltarmos para as nossas cidades “por um outro caminho” (Mt 2,12), por uma estrada nova que renove a nossa maneira de habitar e permanecer. Pedimos esta noite ao Cristo Nosso Senhor nascido em Belém que Ele nos dê a graça e a força de transformarmos as nossas cidades no seu Reino. Queremos percorrer com ele a antiga e sempre renovada via da fé, do amor e da esperança até que chegue do céu a cidade nova onde Deus habitará conosco e nós com Ele para sempre. Amém!


+ Pierbattista Pizzaballa

Fonte: Patriarcado Latino de Jerusalém

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