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quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Homilia do Papa: Missa da Noite de Natal 2018

Missa da Noite de Natal
Homilia do Papa Francisco
Basílica Vaticana
Segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Juntamente com Maria sua esposa, José subiu «à cidade de Davi, chamada Belém» (Lc 2,4). Nesta noite, também nós subimos a Belém, para lá descobrir o mistério do Natal.
1. Belém: o nome significa casa do pão. Hoje, nesta «casa», o Senhor marca encontro com a humanidade. Sabe que precisamos de alimento para viver. Mas sabe também que os alimentos do mundo não saciam o coração. Na Sagrada Escritura, o pecado original da humanidade aparece associado precisamente com o ato de tomar alimento: «tomou o fruto, comeu», diz o Livro do Gênesis (Gn 3,6). Tomou e comeu. O homem tornou-se ávido e voraz. Para muitos, o sentido da vida parece ser possuir, estar cheio de coisas. Uma ganância insaciável atravessa a história humana, chegando ao paradoxo de hoje em que alguns se banqueteiam lautamente enquanto muitos não têm pão para viver.
Belém é o ponto de viragem no curso da história. Lá Deus, na casa do pão, nasce numa manjedoura; como se quisesse dizer-nos: Estou aqui ao vosso dispor, como vosso alimento. Não agarra, oferece de comer; não dá uma coisa, mas dá-Se a Si mesmo. Em Belém, descobrimos que Deus não é alguém que agarra a vida, mas Aquele que dá a vida. Ao homem, habituado desde os primórdios a agarrar e comer, Jesus começa a dizer: «Tomai, comei. Este é o meu corpo» (Mt 26,26). O corpo pequenino do Menino de Belém lança um novo modelo de vida: não devorar e acumular, mas partilhar e dar. Deus faz-Se pequeno, para ser nosso alimento. Nutrindo-nos d’Ele, Pão de vida, podemos renascer no amor e romper a espiral da avidez e da ganância. A partir da «casa do pão», Jesus traz o homem de regresso a casa, para que se torne familiar do seu Deus e irmão do seu próximo. Diante da manjedoura, compreendemos que não são os bens que alimentam a vida, mas o amor; não a voracidade, mas a caridade; não a abundância ostentada, mas a simplicidade que devemos preservar.
O Senhor sabe que precisamos de nos alimentar todos os dias. Por isso, ofereceu-nos todos os dias da sua vida, desde a manjedoura de Belém até ao cenáculo de Jerusalém. E ainda hoje, no altar, faz-Se pão partido para nós: bate à porta, para entrar e cear conosco (cf. Ap 3,20). No Natal, recebemos Jesus, Pão do céu na terra: trata-se de um alimento cuja validade é ilimitada, fazendo-nos saborear já agora a vida eterna.
Em Belém, descobrimos que a vida de Deus corre nas veias da humanidade. Se a acolhermos, a história muda a partir de cada um de nós; com efeito, quando Jesus muda o coração, o centro da vida já não é o meu «eu» faminto e egoísta, mas Ele, que nasce e vive por amor. Nesta noite, chamados a ir até Belém, casa do pão, interroguemo-nos: Qual é o alimento de que não posso prescindir na minha vida? É o Senhor ou outra coisa qualquer? Depois, entrando na gruta, ao vislumbrar na terna pobreza do Menino uma nova fragrância de vida, a da simplicidade, perguntemo-nos: Será verdade que preciso de tantas coisas, de receitas complicadas para viver? Quais são os contornos supérfluos de que consigo prescindir para abraçar uma vida mais simples? Em Belém, ao pé de Jesus, vemos pessoas que caminharam, como Maria, José e os pastores. Jesus é o Pão do caminho. Não Se compraz com as digestões lentas, longas e sedentárias, mas pede que nos levantemos rapidamente da mesa a fim de servir como pães partidos para os outros. Perguntemo-nos: No Natal, reparto o meu pão com aqueles que estão sem ele?

2. Depois de Belém, casa do pão, reflitamos sobre Belém, cidade de Davi. Lá Davi, na sua adolescência, era pastor e, como tal, foi escolhido por Deus, para ser pastor e guia do seu povo. No Natal, na cidade de Davi, são precisamente os pastores que acolhem Jesus. Naquela noite, quando «a glória do Senhor refulgiu em volta deles - diz o Evangelho -, tiveram muito medo» (Lc 2,9), mas o anjo disse-lhes: «Não tenhais medo!» (v. 10). Reaparece muitas vezes no Evangelho esta frase «Não tenhais medo»: parece o refrão de Deus à procura do homem. Porque o homem desde o princípio, por causa do pecado, tem medo de Deus: «cheio de medo, escondi-me» (Gn 3,10), diz Adão, depois do pecado. Belém é o remédio para o medo, porque lá, não obstante os «nãos» do homem, Deus diz para sempre «sim»: será para sempre Deus conosco. E, para que a sua presença não provoque medo, faz-Se um terno menino. A frase «não tenhais medo» não é dirigida a santos, mas a pastores, pessoas simples que então não primavam por garbo nem devoção. O Filho de Davi nasceu no meio dos pastores, para nos dizer que doravante ninguém estará sozinho; temos um Pastor que vence os nossos medos e nos ama a todos, sem exceção.
Os pastores de Belém mostram-nos também como ir ao encontro do Senhor. Velam durante a noite: não dormem, mas fazem aquilo que Jesus nos pedirá várias vezes: vigiar (cf. Mt 25,13; Mc 13,35; Lc 21,36). Permanecem vigilantes; aguardam, acordados, na escuridão; e a glória de Deus «refulgiu em volta deles» (Lc 2,9). O mesmo vale para nós. A nossa vida pode ser uma expectação, em que a pessoa, mesmo nas noites dos problemas, se confia ao Senhor e O deseja; então receberá a sua luz. Ou então uma pretensão, na qual contam apenas as próprias forças e meios; mas, neste caso, o coração permanece fechado à luz de Deus. O Senhor gosta de ser aguardado e não é possível aguardá-Lo no sofá, dormindo. De fato, os pastores movem-se: «foram apressadamente», diz o texto (v. 16). Não ficam parados como quem sente ter chegado a casa e não precisa de nada; mas partem, deixam o rebanho indefeso, arriscam por Deus. E depois de terem visto Jesus, embora sem grande habilidade para falar, vão anunciá-Lo, de modo que «todos os que ouviram se admiravam do que lhes diziam os pastores» (v. 18).
Esperar acordado, ir, arriscar, contar a beleza são gestos de amor. O Bom Pastor, que vem no Natal para dar a vida às ovelhas, na Páscoa dirigirá a Pedro, e através dele a todos nós, a pergunta determinante: «Tu Me amas?» (Jo 21,15). Da resposta, dependerá o futuro do rebanho. Nesta noite, somos chamados a responder, dizendo-Lhe também nós: «Sou teu amigo». A resposta de cada um é essencial para todo o rebanho.
«Vamos a Belém...» (Lc 2,15): assim disseram e fizeram os pastores. Também nós, Senhor, queremos vir a Belém. O caminho, ainda hoje, é difícil: é preciso superar os cumes do egoísmo, evitar escorregar nos precipícios da mundanidade e do consumismo. Quero chegar a Belém, Senhor, porque é lá que me esperas. E dar-me conta de que Tu, colocado numa manjedoura, és o pão da minha vida. Preciso da terna fragrância do teu amor, a fim de tornar-me, por minha vez, pão repartido para o mundo. Toma-me sobre os teus ombros, bom Pastor: amado por Ti, conseguirei também eu amar tomando pela mão os irmãos. Então será Natal, quando Te puder dizer: «Senhor, Tu sabes tudo; Tu sabes que eu sou teu amigo!» (Jo 21,17).


Fonte: Santa Sé.

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