Páginas

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

O valor da Assembleia Litúrgica

Nas três primeiras quartas-feiras de novembro, o Programa Brasileiro da Rádio Vaticano apresentou uma reflexão sobre o valor da assembleia litúrgica, o primeiro dos dez aspectos da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II que foram apresentados em outubro.
Eis o texto completo das três reflexões:

(01 de novembro)

No programa passado, o Padre Gerson Schmidt, que tem nos acompanhado neste percurso sobre os documentos conciliares, nos apresentou 10 aspectos da renovação litúrgica propostos pela Constituição Sacrosanctum Concilium. Na edição de hoje deste nosso espaço, o sacerdote nos traz uma breve reflexão sobre o primeiro ponto: “O valor da Assembleia Litúrgica”:
“Na reforma litúrgica do Concilio Vaticano II, percebemos 10 aspectos de renovação, a partir da constituição Sacrosanctum Concilium, que aqui enumeramos na oportunidade anterior. Hoje falamos do primeiro aspecto: o valor da assembleia litúrgica. Fazemos nos valer aqui também da reforma litúrgica do Missal Romano e também do Catecismo da Igreja Católica, ambos renovados e atualizados depois do Concilio, já com as devidas inovações e orientações dos padres conciliares.
O Catecismo da Igreja Católica, aplicando na prática a renovação litúrgica, foi publicado no Pontificado de João Paulo II. Era um desejo dos padres conciliares compor um compêndio que elencasse toda a doutrina católica. No número 1136 do Catecismo, fala da celebração Litúrgica: quem celebra, como se celebra e tantos outros aspectos. Sobre o ponto destacado da assembleia litúrgica, o catecismo diz assim:
CIC 1140 - É toda a comunidade, o corpo de Cristo unido à sua Cabeça, que celebra. “As ações litúrgicas não são ações privadas, mas celebrações da Igreja, que é o 'sacramento da unidade', isto é, o povo santo, unido e ordenado sob a direção dos Bispos. Por isso, estas celebrações pertencem a todo o corpo da Igreja, influem sobre ele e o manifestam; mas atingem a cada um de seus membros de modo diferente, conforme a diversidade de ordens, ofícios e da participação atual efetiva”. É por isso que “todas as vezes que os ritos, de acordo com sua própria natureza, admitem uma celebração comunitária, com assistência e participação ativa dos fiéis, seja inculcado que na medida do possível, ela deve ser preferida à celebração individual ou quase privada”.
Toda Liturgia, por mais privada que seja, em qualquer eremitério ou nas pequenas comunidades longínquas, sempre terá um aspecto comunitário e universal. É toda a Igreja que celebra o mistério pascal. A celebração individual, mesmo sem assembleia, é permitida aos sacerdotes, pela necessidade de celebrar todos os dias, pelo direito Canônico. Mas deve-se preferir a celebração com a assembleia, nessa nova visão conciliar. Todos somos celebrantes. O padre é tão somente o celebrante principal”.

(08 de novembro)

 Na reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, é possível distinguir claramente 10 aspectos de renovação a partir da Constituição Sacrosanctum Concilium. Neste espaço Memória Histórica, vamos abordar um a um destes aspectos. Na edição de hoje, damos continuidade ao tema iniciado no programa passado, “O valor da Assembleia Litúrgica”. Padre Gerson Schmidt:
“No programa anterior falamos do valor da assembleia Litúrgica, como um dos 10 aspectos da renovação da liturgia proposta pela Sacrosanctum Concilium. Hoje continuamos a aprofundar esse primeiro aspecto do valor da assembléia litúrgica. Apontamos o número 1140 – do Catecismo da Igreja Católica, onde diz que “É toda a comunidade, o corpo de Cristo unido à sua Cabeça, que celebra.
“As ações litúrgicas não são ações privadas, mas celebrações da Igreja, que é o 'sacramento da unidade', isto é, o povo santo, unido e ordenado sob a direção dos Bispos. Por isso, estas celebrações pertencem a todo o corpo da Igreja, influem sobre ele e o manifestam” (CIC, 1140). Não podemos, portanto, privatizar a liturgia, mas olhar a Eucaristia dentro da visão de que a assembleia litúrgica é um corpo orante, onde todos os membros celebram e atuam a seu modo. Tudo parte da visão das imagens da Lumen Gentium de que a Igreja é o Corpo Místico de Cristo ou Povo de Deus que caminha.
Não vamos a missa para simplesmente cumprir individualmente um preceito dominical, mas nos encontrar e celebrar com a comunidade a que pertencemos como membros participativos de uma Igreja (Ecclesia – assembleia dos convocados pela Palavra).
No número 1141, do Catecismo da Igreja Católica continua a expressar a importância da Assembleia Litúrgica, dizendo assim: “A assembleia que celebra é a comunidade dos batizados, os quais, “pela regeneração e unção do Espírito Santo, são consagrados para serem casa espiritual e sacerdócio santo e para poderem oferecer um sacrifício espiritual toda atividade humana do cristão”.
Este “sacerdócio comum” é o de Cristo, único sacerdote, participado por todos os seus membros: A mãe Igreja deseja ardentemente que todos os fiéis sejam levados àquela plena, consciente e ativa participação nas celebrações litúrgicas que a própria natureza da liturgia exige e à qual, por força do batismo, o povo cristão, “geração escolhida, sacerdócio régio, gente santa, povo de conquista” (1Pd 2,9), tem direito e obrigação”. Dessa participação ativa da assembleia litúrgica, como direito e obrigação, falaremos ainda mais adiante.
As diretrizes mais importantes que a Sacrosanctum Concilium dá para a reforma da liturgia estão em relação com as deficiências mais notáveis existentes na vida litúrgica dos cristãos: a desconexão com a Palavra de Deus e a perda do sentido comunitário. Por culpa destes fatores, a religiosidade de muitos católicos tinha perdido contato com a fonte genuína, que é sempre a Palavra de Deus como expressão de sua vontade e de seu desígnio de salvação, e se havia refugiado num individualismo egocêntrico e de horizontes muito limitados.
A Igreja deseja agora reformar a liturgia nesta dupla direção: abrir com maior abundância os tesouros da Palavra de Deus e destacar com mais intensidade e eficácia o aspecto comunitário das ações litúrgicas, buscando resgatar a todo o custo a participação plena, ativa e fecunda dos fiéis nas celebrações [1].
As estruturas das novas construções dos templos, a partir do Concilio, já contemplam uma visão mais comunitária, com o estilo das construções em forma mais oval e arredondada, permitindo a todos visualizarem e participarem melhor do Mistério Pascal celebrado. Seria um contrassenso fazer hoje as igrejas-templos como antigamente, de forma mais vertical e clerical. Há uma nova mentalidade, fruto da eclesiologia de comunhão e participação".

(15 de novembro)

“O Concílio desloca o centro. De uma liturgia centralizada na pessoa do ‘sacerdote celebrante’ para a assembleia do ‘povo sacerdotal’”. Este foi um dos aspectos levantados pelo Padre Gerson Schmidt no programa passado, ao comentar o tema “Assembleia Litúrgica na Sacrosanctum Concilium”.
Neste nossos espaço, temos refletido sobre 10 aspectos da renovação litúrgica trazida com o Concílio Vaticano II. Na edição de hoje, o sacerdote incardinado na Arquidiocese de Porto Alegre nos fala sobre o tema “Povo sacerdotal que celebra [2]”:
“A compreensão da Sacrosanctum Concilium não é de um povo qualquer que está na missa ou na liturgia apático, sem sentido, aéreo ou apenas como um mero espectador, que não entende nada do que está ali acontecendo. A visão da SC é de um povo sacerdotal, um povo que celebra em comunidade aquilo que de mais genuíno tem para celebrar: o mistério pascal em suas vidas.
O Concílio resgata a liturgia como ação do povo sacerdotal, numa feliz referência a Primeira Carta de São Pedro, que diz: “Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pd 2,9). Assim, o povo é convocado e congregado para a escuta da Palavra e a renovação da aliança com o Senhor, tão desejado por Deus ao Povo Eleito (cf. Dt 4,10; 10,4.9; Ex 19-24).
A resposta ao convite de Deus, que se traduz em adesão e participação, constitui a assembleia do povo sacerdotal. Jesus Cristo, o sumo sacerdote, reúne seu povo, a quem, pelo batismo, torna apto para participar de seu sacerdócio. “Fez do novo povo um reino de sacerdotes para Deus, seu Pai”, conforme o livro do Apocalipse (cf. Ap 1,6; 5,9-10).
O Concílio desloca o centro celebrativo – não é o sacerdote o foco. Há uma descentralização eclesial, outrora acentuando demasiadamente o sacerdote que ofertava o sacrifício.  De uma liturgia centralizada na pessoa do “sacerdote celebrante” (que na liturgia não é único que celebra) se volta agora a ação litúrgica para a assembleia do “povo sacerdotal”. Como diz a Sacrosanctum Concilium, número 33: “As orações dirigidas a Deus pelo sacerdote que preside à comunidade na pessoa de Cristo são rezadas em nome de todo o povo santo e de todos os que estão presentes” (SC 33). Já não se fala do “sacerdote que celebra” e dos fiéis que assistem. Não se usa mais o verbo assistir à Missa.
O verbo pós-conciliar é “participar”, “celebrar”. Todos os membros da assembleia devem estar envolvidos na ação celebrativa e pela ação celebrativa. “Para isso, a Igreja procura, solícita e cuidadosa, que os cristãos não assistam a este mistério de fé como estranhos ou espectadores mudos” (SC 48), como se estivessem num espetáculo ou num teatro, fora da ação celebrativa. Em vista da ação eminentemente eclesial, o Concílio declara: “É desejo ardente da mãe Igreja que todos os fiéis cheguem àquela plena, consciente e ativa participação na celebração litúrgica que a própria natureza da liturgia exige e à qual o povo cristão, ‘raça escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido’ (1Pd 2,9), tem direito e obrigação, por força do batismo” (SC 14).
A liturgia, por um lado, é “obra de Cristo e da Igreja, seu corpo” (SC 7). Por outro lado, também é ação do “povo santo reunido e ordenado sob a direção dos bispos” (SC 26), portanto, orientado por um magistério eclesial que garanta a genuinidade e sacralidade do mistério eucarístico. Portanto, não está centrada a liturgia no sacerdote, mas na assembleia litúrgica, no povo, como sujeito da celebração".

[1] Cf. Pe. Antonio Élcio de Souza / Pe. José Humberto Motta. O contexto litúrgico da Igreja antes do Concílio Vaticano II. Faculdade Católica de Filosofia e Teologia da Arquidiocese de Ribeirão Preto.
[2] Reflexões inspiradas em Frei Faustino Paludo, OFMCap, publicado na Revista Vida Pastoral em Maio-Junho de 2003 (24-27), intitulado “O povo celebrante: sujeito da celebração”.


O próximo tema a ser refletido é o uso da língua vernácula.

Nenhum comentário:

Postar um comentário