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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

A despedida do Aleluia

"Nós temos costume de cantar solenemente o Aleluia em determinado tempo, segundo a antiga tradição da Igreja, e não o cantamos em certos dias sem sacramento. Se é certo que só cantamos o Aleluia em certos dias, não é menos certo que pensamos nele todos os dias” (Santo Agostinho, Comentário ao Salmo 106).


O Aleluia (do hebraico Halleluya, “louvai a Yaweh”) é, desde o início da Igreja, a expressão máxima de louvor a Deus. Portanto, desde o início do século V, como indica o texto de Agostinho que citamos acima, era costume omitir esta aclamação em determinados dias penitenciais, ou seja, durante a Quaresma.

A omissão do Aleluia na Quaresma tem um duplo sentido. Primeiramente, para reforçar o caráter penitencial deste tempo. E, além disso, para enfatizar a novidade do Aleluia pascal, proclamado solenemente antes do Evangelho da Ressurreição, na Vigília Pascal.

No final do século VI, com a introdução das três semanas pré-quaresmais (Tempo da Septuagésima), a omissão do Aleluia passa a iniciar-se no Domingo da Septuagésima. Por intervenção de São Gregório Magno, a liturgia deste domingo se tornou uma grande glorificação do Aleluia, inclusive com o duplo Aleluia na despedida das Vésperas, gesto atualmente reservado às solenidades da Páscoa (com sua oitava) e Pentecostes.

São Gregório Magno
Durante o pontificado de Gregório VII (1070-1085) os Aleluias do Domingo da Septuagésima são suprimidos, e o Aleluia passa a ser omitido a partir da hora nona (15h) do sábado que antecede a Septuagésima.

Surgem neste período algumas curiosas cerimônias de “despedida” do Aleluia no sábado que antecede a Septuagésima. Na diocese de Toul (França), por exemplo, havia o rito da Depositio Alleluiae, literalmente a “sepultura do Aleluia”.

Às 15h reuniam-se os pueri chantores (meninos membros do coro) na sacristia, de onde partiam em procissão através da igreja com incenso, cruz processional, velas e uma caixa vazia, representando o “caixão” do Aleluia. Este era depositado em um local adequado (um altar lateral, por exemplo) e solenemente incensado.

"Caixão" do Aleluia
As orações do domingo da Septuagésima na Liturgia Hispano-Mozárabe, própria da Arquidiocese de Toledo (Espanha), apresentavam o Aleluia como um personagem e desejavam-lhe uma “boa viagem” durante sua ausência na Quaresma. Veja-se, por exemplo, um responsório das Laudes deste domingo:

V. Te vas, Aleluya. Que tengas buen viaje, Aleluya.
R. Y vuelvas contento a visitarnos, Aleluya.
V. Que los ángeles te lleven en sus brazos para que tu pie no tropiece en piedra alguna. R. Y vuelvas contento a visitarnos, Aleluya.
V. Gloria y honor al Padre y al Hijo y al Espíritu Santo, por los siglos de los siglos. Amén.
R. Y vuelvas contento a visitarnos. Aleluya.

V. Você vai, Aleluia. Que tenha uma boa viagem, Aleluia.
R. E voltes feliz a visitar-nos, Aleluia.
V. Que os anjos te levem em seus braços para que teu pé não tropece em alguma pedra.
R. E voltes feliz a visitar-nos, Aleluia.
V. Glória e louvor ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.
R. E voltes feliz a visitar-nos, Aleluia.

A Liturgia Romana não prescreve nada para a despedida do Aleluia, que passa a ser omitido a partir da Quarta-feira de Cinzas, sendo entoado até a terça-feira de Carnaval inclusive. Sugerimos aos fiéis neste dia, no âmbito da piedade popular, realizar um jantar festivo em família ou entre amigos e entoar pela última vez o Aleluia (como refrão de um salmo, por exemplo), antes de entoá-lo mais uma vez na solene Vigília Pascal.

Até lá, ¡que tengas buen viaje, Aleluya!


Referências:

AGOSTINHO. Comentário aos Salmos (Ennarationes in Psalmos) - in: CORDEIRO, José de Leão (Org.). Antologia Litúrgica: Textos Litúrgicos, Patrísticos e Canónicos do Primeiro Milénio. Secretariado Nacional de Liturgia: Fatima, 2003, p. 771.

RIGHETTI, Mario. Historia de la Liturgia. Biblioteca de Autores Cristianos: Madrid, 1945, v. I, pp. 733-735.

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