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quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Discurso do Papa no Encontro com as Famílias

VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO AO SRI LANKA E ÀS FILIPINAS
(12-19 DE JANEIRO DE 2015)
ENCONTRO DAS FAMÍLIAS
DISCURSO DO SANTO PADRE
Mall of Asia Arena, Manila
Sexta-feira, 16 de Janeiro de 2015

Queridas famílias,
Queridos amigos em Cristo!
Obrigado pela vossa presença aqui, nesta noite, e pelo testemunho do vosso amor a Jesus e à sua Igreja. Agradeço a D. Reyes, Presidente da Comissão Episcopal para a Família e a Vida, as suas palavras de boas-vindas em vosso nome. De maneira particular, agradeço àqueles que apresentaram o seu testemunho – obrigado! – e partilharam connosco a sua vida de fé. A Igreja nas Filipinas é abençoada pelo apostolado de muitos movimentos que se ocupam da família; agradeço-lhes pelo seu testemunho.
Raramente as Escrituras falam de São José e, quando o fazem, muitas vezes encontramo-lo a repousar, enquanto lhe é revelada em sonho a vontade de Deus. No texto do Evangelho que acabámos de ouvir, encontramos, não uma mas duas vezes, José a repousar. Nesta noite, quero repousar no Senhor com todos vós. Preciso de repousar no Senhor com as famílias, e recordar a minha família: meu pai, minha mãe, meu avô, minha avó… Hoje eu repouso convosco e quero reflectir convosco sobre o dom da família.
Mas, antes, quero dizer algo sobre o sonho. O meu inglês, porém, é tão pobre! Se mo permitis, vou pedir a Mons. Miles que traduza e eu falarei em espanhol. Tenho em muito apreço o sonhar numa família. Toda a mãe e todo o pai sonharam o seu filho durante nove meses. É verdade ou não? [Sim!]. Sonharam como seria aquele filho… Não é possível uma família sem o sonho. Numa família, quando se perde a capacidade de sonhar, os filhos não crescem, o amor não cresce; a vida debilita-se e apaga-se. Por isso, recomendo-vos que à noite, ao fazer o exame de consciência, vos ponhais também esta pergunta: Hoje sonhei com o futuro dos meus filhos? Hoje sonhei com o amor do meu esposo, da minha esposa? Hoje sonhei com os meus pais, os meus avós que fizeram a vida avançar até mim. É muito importante sonhar. Antes de mais nada, numa família, sonhai. Não percais esta capacidade de sonhar.
E, na vida dos cônjuges, quantas dificuldades se resolvem, se conservarmos um espaço para o sonho, se nos detivermos a pensar no cônjuge e sonharmos com a bondade, com as coisas boas que tem. Por isso, é muito importante recuperar o amor através do sonho de cada dia. Nunca deixeis de ser namorados!
O repouso de José revelou-lhe a vontade de Deus. Neste momento de repouso no Senhor, pondo de lado os nossos numerosos deveres e actividades diárias, Deus fala também a nós. Fala-nos na leitura que ouvimos, nas nossas orações e testemunhos e no silêncio do nosso coração. Reflictamos sobre o que nos está a dizer o Senhor, especialmente no Evangelho desta noite. Há três aspectos deste texto que vos peço para considerardes: primeiro, repousar no Senhor; segundo, levantar-se com Jesus e Maria; terceiro, ser voz profética.
Repousar no Senhor. O repouso, apesar de ser necessário para a saúde das nossas mentes e dos nossos corpos, com frequência é muito difícil de conciliar por causa das numerosas exigências que gravam sobre nós. Mas o repouso é essencial também para a nossa saúde espiritual, para podermos ouvir a voz de Deus e compreender aquilo que nos pede. José foi escolhido por Deus para ser pai putativo de Jesus e marido de Maria. Como cristãos, também vós sois chamados, à semelhança de José, a preparar uma casa para Jesus. Preparar uma casa para Jesus. Preparais uma casa para Ele nos vossos corações, nas vossas famílias, nas vossas paróquias e nas vossas comunidades.
Para ouvir e aceitar a chamada de Deus, para construir uma casa para Jesus, deveis ser capazes de repousar no Senhor. Deveis encontrar cada dia o tempo para repousar no Senhor, para rezar. Rezar é repousar no Senhor. Mas poderíeis dizer-me: Santo Padre, isso sabemos nós; eu quero rezar, mas há tanto que fazer! Devo cuidar dos meus filhos; tenho os deveres de casa; estou demasiado cansado até mesmo para dormir bem. É justo. Isto até pode ser verdade; mas, se não rezarmos, nunca conheceremos a coisa mais importante de todas: a vontade de Deus a nosso respeito. Além disso, durante toda a nossa actividade, na multiplicidade das nossas ocupações, com a nossa oração tudo conseguiremos.
Repousar na oração é particularmente importante para as famílias. É, antes de tudo, na família que aprendemos como rezar. Não esqueçais: quando a família reza unida, permanece unida. Isto é importante. Nela chegamos a conhecer Deus, a crescer como homens e mulheres de fé, a considerar-nos como membros da família mais ampla de Deus, a Igreja. Na família, aprendemos a amar, a perdoar, a ser generosos e disponíveis e não fechados e egoístas. Aprendemos a ir além das nossas próprias necessidades, para encontrar outras pessoas e partilhar as nossas vidas com elas. Por isso é tão importante rezar como família. Tão importante! É por isso que as famílias são tão importantes no plano de Deus para a Igreja. Repousar no Senhor é rezar, unidos em família.
Queria ainda dizer-vos algo de pessoal. Amo muito São José, porque é um homem forte e silencioso. Na minha escrivaninha, tenho uma imagem de São José que dorme e, enquanto dorme, cuida da Igreja. Sim! Pode fazê-lo, como sabemos. E, quando tenho um problema, uma dificuldade, escrevo um bilhetinho e meto-o debaixo de São José, para que o sonhe. Este gesto significa: reza por este problema.
Agora vejamos o segundo ponto: levantar-se com Jesus e Maria. Estes momentos preciosos de repouso, duma pausa com o Senhor na oração, talvez gostássemos de poder prolongá-los. Mas, como São José, uma vez que se ouviu a voz de Deus, temos de despertar do nosso sono; devemos levantar-nos e agir (cf. Rm 13, 11). Em família, devemos levantar-nos e agir. A fé não nos tira do mundo, mas insere-nos mais profundamente nele. Isto é muito importante. Devemos caminhar em profundidade no mundo, mas com a força da oração. Na realidade, a cada um de nós cabe um papel especial na preparação da vinda do Reino de Deus ao nosso mundo.
Tal como o dom da Sagrada Família foi confiado a São José, assim também o dom da família e o seu lugar no plano de Deus estão confiados a nós. Como a São José. O dom da Sagrada Família foi confiado a São José, para que o levasse por diante. A cada um de vós – e de nós, porque também eu sou filho duma família – é confiado o plano de Deus, para que seja levado por diante. O Anjo do Senhor revelou a José os perigos que ameaçavam Jesus e Maria, obrigando-os a fugir para o Egipto e, em seguida, estabelecer-se em Nazaré. De igual modo, no nosso tempo, Deus chama-nos a reconhecer os perigos que ameaçam as nossas próprias famílias e a protegê-las do mal.
Existem colonizações ideológicas que procuram destruir a família. Não nascem do sonho, da oração, do encontro com Deus, da missão que Deus nos dá. Provêm de fora; por isso, digo que são colonizações. Não percamos a liberdade da missão que Deus nos dá, a missão da família E assim como os nossos povos, num determinado momento da sua história, chegaram à maturidade de dizer «não» a qualquer colonização política, assim também como família devemos ser muito sagazes, muito hábeis, muito fortes, para dizer «não» a qualquer tentativa de colonização ideológica da família. E pedir a intercessão de São José, que é amigo do Anjo, para saber quando podemos dizer «sim» e quando devemos dizer «não».
Hoje os pesos que gravam sobre a vida da família são muitos. Aqui, nas Filipinas, inumeráveis famílias sofrem ainda as consequências das catástrofes naturais. A situação económica provocou a fragmentação das famílias com a emigração e a busca de um emprego, para além dos problemas financeiros que atormentam muitos lares domésticos. Enquanto muitas pessoas vivem em pobreza extrema, outras caem nas malhas do materialismo e de estilos de vida que abolem a vida familiar e as exigências mais fundamentais da moral cristã. Estas são as colonizações ideológicas. A família está ameaçada também pelos crescentes esforços de alguns em redefinir a própria instituição do matrimónio mediante o relativismo, a cultura do efémero, a falta de abertura à vida.
Penso no Beato Paulo VI. Num período em que se propunha o problema do crescimento demográfico, teve a coragem de defender a abertura à vida na família. Ele conhecia as dificuldades que havia em cada família; por isso, na sua Encíclica, era tão misericordioso com os casos particulares. E pediu aos confessores que fossem muito misericordiosos e compreensivos com os casos particulares. Mas ele olhou mais longe: olhou os povos da terra e viu esta ameaça da destruição da família pela falta de filhos. Paulo VI era corajoso, era um bom pastor e avisou as suas ovelhas a propósito dos lobos que chegavam. Que ele, lá do Céu, nos abençoe nesta tarde!
O nosso mundo tem necessidade de famílias sãs e fortes para superar estas ameaças. As Filipinas precisam de famílias santas e cheias de amor para proteger a beleza e a verdade da família no plano de Deus e servir de apoio e exemplo para as outras famílias. Toda a ameaça à família é uma ameaça à própria sociedade. O futuro da humanidade – como várias vezes disse SãoJoão Paulo II – passa através da família (cf. Familiaris consortio, 85). O futuro passa através da família. Por isso, guardai as vossas famílias. Protegei as vossas famílias! Vede nelas o maior tesouro da vossa nação, e alimentai-as sempre com a oração e a graça dos sacramentos. As famílias sempre terão as suas provações, não precisam que lhes junteis mais! Pelo contrário, sede exemplos de amor, perdão e solicitude. Sede santuários de respeito pela vida, proclamando a sacralidade de toda a vida humana desde a concepção até à morte natural. Que grande dom seria isto para a sociedade: cada família cristã viver plenamente a sua nobre vocação! Então, levantai-vos com Jesus e Maria e disponde-vos a percorrer a estrada que o Senhor traça para cada um de vós.
Por fim, o Evangelho que ouvimos recorda-nos que o nosso dever de cristãos é ser vozes proféticas no meio das nossas comunidades. José ouviu a voz do Anjo do Senhor e respondeu à chamada que Deus lhe fez de cuidar de Jesus e Maria. Assim desempenhou ele o seu papel no plano de Deus e tornou-se uma bênção não só para a Sagrada Família, mas também para toda a humanidade. Juntamente com Maria, José serviu de modelo para o menino Jesus que ia crescendo em sabedoria, idade e graça (cf. Lc 2, 52). Quando as famílias permitem às crianças nascer para este nosso mundo, as educam na fé e em sãos valores e as ensinam a dar a sua contribuição para a sociedade, tornam-se uma bênção ao seu redor. As famílias podem tornar-se uma bênção para o mundo. O amor de Deus torna-se presente e activo a partir do modo como nós amamos e das boas obras que praticamos. Fazemos crescer o Reino de Cristo neste mundo. Ao fazê-lo, mostramo-nos fiéis à missão profética que recebemos no Baptismo.
Durante este ano consagrado pelos vossos bispos como Ano dos Pobres, pedir-vos-ia que estivésseis, como família, particularmente atentos à vossa chamada para ser discípulos missionários de Jesus. Isto significa estar prontos para ir além dos limites das vossas casas e cuidar dos irmãos e irmãs mais necessitados. Peço que vos interesseis de modo especial por aqueles que não têm uma família própria, particularmente os idosos e as crianças sem pais. Nunca os deixeis sentir-se isolados, sozinhos e abandonados, mas ajudai-os a saber que Deus não os esqueceu. Hoje, depois da Missa, senti-me profundamente comovido ao visitar aquela casa de crianças sozinhas, sem família. E, na Igreja, quantas pessoas trabalham para que aquela casa seja uma família! Isto significa levar por diante, profeticamente, o significado duma família.
E, no caso de vós próprios serdes pobres em sentido material, sabei que tendes uma abundância de dons a distribuir quando ofereceis Cristo e a comunidade da sua Igreja. Não escondais a vossa fé, não escondais Jesus, mas colocai-O no mundo e oferecei o testemunho da vossa vida familiar.
Queridos amigos em Cristo, sabei que rezo sempre por vós. Rezo pelas famílias; rezo mesmo! Rezo para que o Senhor continue a aprofundar o vosso amor por Ele e que este amor se possa manifestar no vosso amor recíproco e pela Igreja. Não esqueçais Jesus que dorme. Não esqueçais São José que dorme. Jesus dormiu com a protecção de José. Não esqueçais: o repouso da família é a oração. Não esqueçais de rezar pela família. Rezai com frequência e levai os frutos da vossa oração para o mundo, a fim de que todos possam conhecer Jesus Cristo e o seu amor misericordioso. Por favor, «dormi» também por mim: rezai também por mim; preciso verdadeiramente das vossas orações e sempre contarei com elas. Muito obrigado!



Fonte: Santa Sé

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