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terça-feira, 5 de março de 2013

Como funciona o conclave

Ao encerrar-se o pontificado do Papa Bento XVI, devido a sua livre renúncia, entramos no período de Sede Vacante, durante o qual a administração da Igreja fica a cargo do Colégio dos Cardeais, para tratar da eleição do novo Pontífice e para questões mais graves, e da Câmara Apostólica, para assuntos administrativos e questões mais simples.

A Câmara Apostólica é presidida pelo Camerlengo da Santa Igreja, cargo atualmente ocupado pelo Cardeal Tarcísio Bertone. A ele compete primeiramente lacrar no Palácio Apostólico os aposentos papais, que só poderão ser ocupados pelo próximo Papa.

Cardeal Bertone lacra o Palácio (2013)
O Colégio dos Cardeais é presidido pelo Decano, Cardeal Ângelo Sodano. A ele compete convocar todos os Cardeais a Roma para participarem do processo de eleição do Pontífice. Os Cardeais com mais de oitenta anos são apenas convidados a virem a Roma; os cardeais que ainda não completaram oitenta anos são convocados, podendo declinar da convocação por motivo grave (é o caso, neste Conclave, dos Cardeais Darmaatmadja e O’Brien).

As Congregações Gerais, atos que precedem o Conclave, realizam-se na Sala do Sínodo no Palácio Apostólico, sob a presidência do Cardeal Decano e com a presença de todos os Cardeais. Nessas assembleias são tratados temas concernentes ao Conclave e a situação atual da Igreja.

Primeira Congregação Geral (2013)
A data da primeira Congregação Geral é definida pelo Camerlengo, juntamente com o Cardeal eleitor mais antigo em tempo de criação de cada ordem: Episcopal (Cardeal Giovanni Battista Re), Presbiteral (Cardeal Godfried Daneels) e Diaconal (Cardeal Jean-Louis Tauran).

Na primeira Congregação os Cardeais devem prestar o seguinte juramento (a primeira parte todos juntos e a segunda individualmente):

Nós, Cardeais da Santa Igreja Romana, da Ordem dos Bispos, dos Presbíteros e dos Diáconos, prometemos, obrigamo-nos e juramos, todos e cada um, observar exata e fielmente todas as normas contidas na Constituição Apostólica Universi Dominici Gregis do Sumo Pontífice João Paulo II, e guardar escrupulosamente o segredo sobre tudo aquilo que, de qualquer modo, se relacione com a eleição do Romano Pontífice, ou que, por sua natureza, durante a vacância da Sé Apostólica, postule o mesmo segredo.

E eu, N. Cardeal N., prometo, obrigo-me e juro. Assim Deus me ajude e estes Santos Evangelhos, que toco com a minha mão.

Juramento na Primeira Congregação Geral (2013)
Durante as demais Congregações Gerais, os Cardeais estudam a Constituição Universi Dominici Gregis, sobre a eleição do Romano Pontífice, e analisam a situação da Igreja no mundo. Também nestas assembleias se anulam o Anel do Pescador e o selo de chumbo utilizado pelo Santo Padre, ofício que compete o Camerlengo.

Anullus Piscatoris (Anel do Pescador)
Além das Congregações Gerais, ocorrem neste período as Congregações particulares, nas quais tomam parte o Camerlengo e um cardeal de cada ordem, escolhidos por sorteio a cada três dias. Nestas reuniões decidem-se  questões mais simples.

Antes ainda do início do Conclave, todos os Cardeais eleitores devem ocupar um quarto, escolhido por sorteio, na Casa Santa Marta, construída sob o pontificado de João Paulo II justamente para acolher os Cardeais em tempos de Sede Vacante. Uma vez hospedados na Casa Santa Marta, os Cardeais ficam incomunicáveis com o mundo exterior, não devendo ter acesso a nenhum meio de comunicação.

Domus Sanctae Marthae (Casa Santa Marta)
Encerradas as Congregações Gerais, têm início o Conclave com a Missa Pro Eligendo Romano Pontifice (Pela eleição do Papa), presidida pelo Cardeal Decano na parte da manhã.

Após a Missa Pro Eligendo Romano Pontifice, na parte da tarde, todos os cardeais eleitores dirigem-se à Capela Paulina do Palácio Apostólico, revestidos com suas veste corais. Desta capela partem em procissão, entoando o hino Veni Creator (Vinde Espírito Criador), até a Capela Sistina.

Nesta procissão, os Cardeais caminham segundo a ordem de precedência: primeiramente a Ordem Diaconal, seguida da Ordem Presbiteral e, por fim, da Ordem Episcopal. Dentro de cada ordem, os Cardeais organizam-se por tempo de criação, os mais novos precedendo os mais velhos.

Procissão no início do Conclave (2005)
Quando todos os Cardeais tomarem seus lugares na Capela Sistina, o Presidente do Conclave (o mais antigo dos Cardeais Bispos eleitores, no caso o Cardeal Re) profere em nome de todos o seguinte juramento:

Nós, todos e cada um dos Cardeais eleitores, presentes nesta eleição do Sumo Pontífice, prometemos, obrigamo-nos e juramos observar fiel e escrupulosamente todas as prescrições contidas na Constituição Apostólica do Sumo Pontífice João Paulo II, Universi Dominici Gregis, emanada a 22 de Fevereiro de 1996. De igual modo, prometemos, obrigamo-nos e juramos que quem quer de nós, que, por divina disposição, for eleito Romano Pontífice, comprometer-se-á a desempenhar fielmente o munus Petrinum de Pastor da Igreja universal e não cessará de afirmar e defender estrenuamente os direitos espirituais e temporais, assim como a liberdade da Santa Sé. Sobretudo prometemos e juramos observar, com a máxima fidelidade e com todos, tanto clérigos como leigos, o segredo acerca de tudo aquilo que, de algum modo, disser respeito à eleição do Romano Pontífice e sobre aquilo que suceder no lugar da eleição, concernente directa ou indirectamente ao escrutínio; não violar, de modo nenhum, este segredo, quer durante quer depois da eleição do novo Pontífice, a não ser que para tal seja concedida explícita autorização do próprio Pontífice; não dar nunca apoio ou favor a qualquer interferência, oposição ou outra forma qualquer de intervenção, pelas quais autoridades seculares de qualquer ordem e grau, ou qualquer género de pessoas, em grupo ou individualmente, quisessem imiscuir-se na eleição do Romano Pontífice.

Em seguida, cada um dos Cardeais eleitores, por ordem de precedência, prestará juramento, tocando o Livro dos Evangelhos:

E eu, N. Cardeal N., prometo, obrigo-me e juroAssim Deus me ajude e estes Santos Evangelhos, que toco com a minha mão.

Juramento (Conclave de 2005)

Quando o último dos Cardeais tiver proferido seu juramento, o Mestre de Cerimônias Litúrgicas do Sumo Pontífice (Mons. Guido Marini) entoará o Extra Omnes (literalmente: Todos fora!), a partir do qual todos os não-eleitores devem sair da Capela Sistina, exceto o próprio Mestre de Cerimônias e o clérigo que foi escolhido pelos Cardeais para proferir a Meditação que precede a votação (Cardeal Prosper Grech, não-eleitor).

Extra Omnes (2005)
Feita a Meditação, saem o Mestre de Cerimônias, o Secretário e o Pregador e a porta é fechada pelo último dos Cardeais Diáconos (Cardeal James Harvey). Tem início então a escolha por sorteio dos três Escrutinadores (responsáveis por apurar os votos), dos três Infirmarii (responsáveis por recolher os votos de cardeais que, por motivo de doença, não puderem sair de seus quartos) e de três Revisores.

Estando cada Cardeal de posse de sua cédula, deve nela escrever em letra legível o nome daquele que julga dever ser eleito. Se a cédula contiver algo além de um nome, o voto é nulo. Podem ser votados não apenas os cardeais eleitores, mas qualquer homem católico batizado.

Escrito o voto, o Cardeal dobra a cédula e, pela ordem de precedência, dirige-se ao altar, sobre o qual está um recipiente coberto com um prato. Contemplando a pintura do Juízo Final de Michelangelo, o Cardeal jura:

Invoco como testemunha Cristo Senhor, o qual me há-de julgar, que o meu voto é dado àquele que, segundo Deus, julgo deve ser eleito.

Afresco do Juízo Final na Capela Sistina
Deposita então a cédula no prato e com este a faz cair no recipiente. Feita a reverência ao altar, retorna ao seu lugar. Se algum Cardeal presente na Capela não puder levantar-se, um dos Escrutinadores vai até ele e recebe a cédula para depositá-la no recipiente. Da mesma forma, os Infirmarii, se necessário, recolhem as cédulas de Cardeais que porventura permanecerem em seus quartos.

Quando todas as cédulas tiverem sido depositadas na urna, o primeiro Escrutinador a agita, para misturar as fichas, e abre. Em seguida, o último escrutinador conta as fichas, a fim de aferir se correspondem ao número de eleitores. Se não corresponderem, são imediatamente queimadas e inicia-se uma nova eleição.

Urnas utilizadas no Conclave
A apuração dos votos dá-se da seguinte forma: o primeiro e o segundo Escrutinadores leem em voz baixa a ficha e o terceiro a lê em voz alta, para que todos possam anotar o voto, se desejarem. Um dos Escrutinadores anota o voto em uma ficha enquanto outro recolhe as cédulas e as costura, unindo-as por um fio.

Para a eleição do Papa, requerem-se dois terços dos votos. No caso do iminente Conclave, no qual tomam parte 115 Cardeais, a soma é de 77 votos. Se ninguém atingiu os dois terços, o último dos Cardeais Diáconos chama à Capela o Mestre de Cerimônias e o Secretário do Colégio Cardinalício (Dom Lorenzo Baldisseri). Os Revisores então conferem a soma dos votos e recolhem as cédulas e todas as anotações, que serão queimadas pelos Escrutinadores, auxiliados pelo Secretário do Colégio Cardinalício. Como não foi eleito o Papa, queima-se com as cédulas uma substância que torna a fumaça negra.

Fumaça negra (2005)
As votações prosseguem até a eleição do Papa, quatro vezes por dia, duas pela manhã e duas pela tarde. A queima dos votos, porém, só se faz no final da manhã e no final da tarde. Durante todo este período os Cardeais eleitores devem estar incomunicáveis ao mundo exterior, aproveitando o tempo livre após as votações para a oração.

Quando alguém atingir os dois terços dos votos, o último dos Cardeais Diáconos chama à Capela o Mestre de Cerimônias e o Secretário do Colégio Cardinalício. Se porventura, o eleito não estiver na Capela Sistina (caso raríssimo de ser um não-Cardeal), deve ser imediatamente chamado.

O Cardeal que preside o Conclave interroga o eleito: Aceitas a tua eleição canônica para Sumo Pontífice? Se este recusar, queimam-se as cédulas e anotações da votação e um novo escrutínio tem início.  Se aceitar, o Presidente do Conclave pergunta: Como queres ser chamado? Escolhido o nome pelo novo Papa, o Mestre de Cerimônias redige a ata oficial da eleição.

Se o eleito for bispo, é imediatamente considerado o Bispo de Roma e o legítimo sucessor de São Pedro, Sumo Pontífice da Igreja de Cristo. Se não for bispo (caso raríssimo), será ordenado pelo Presidente do Conclave.

Em seguida, os Escrutinadores queimam as cédulas e anotações com uma substância que torna a fumaça branca. Ao mesmo tempo, tocam-se os sinos da Basílica Vaticana, dando a conhecer ao mundo que o Papa foi eleito.

Fumaça Branca (2005)
Enquanto isso, o eleito dirige-se à chamada “Sala das Lágrimas”, ao lado da Capela Sistina, onde troca as vestes vermelhas de Cardeal pelas vestes brancas de Papa.

De volta à Capela Sistina, os Cardeais aproximam-se segundo a ordem de precedência para prometer obediência ao novo Pontífice. Quando todos os Cardeais tiverem saudado o Papa, o Protodiácono (Cardeal Jean-Louis Tauran) dirige-se à sacada da Basílica de São Pedro para anunciar ao mundo o nome do novo Papa:

Annuntio vobis gaudium magnum: Habemus Papam!
Eminentissimum ac reverendissimum Dominum,
Dominum [nome de batismo] Sanctæ Romanæ Ecclesiæ Cardinalem [sobrenome],
Qui sibi nomen imposuit [nome escolhido para o pontificado seguido da numeração histórica].

Habemus Papam (2005)
Por fim, o eleito dirige-se à sacada da Basílica Vaticana, de onde saúda os fieis presentes na Praça de São Pedro e os que o acompanham através dos meios de comunicação. Em seguida, concede a todos sua primeira bênção Urbi et Orbi.

Primeira saudação do Papa Bento XVI aos fieis (2005)
Para saber mais, recomenda-se a leitura da Constituição Universi Dominici Gregis.

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